BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) - Os 5.200 condenados pela Justiça que conseguiram obter, renovar ou manter o registro de CAC (caçador, atirador e colecionador) junto ao Exército entre 2019 e 2022 respondiam principalmente a acusações por porte ou posse ilegal de armas, lesão corporal e tráfico de drogas.

Levantamento com informações dos antecedentes criminais dos CACs consta de relatório produzido pelo TCU (Tribunal de Contas da União) sobre a atuação dos militares no controle de armas durante a gestão do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).

De acordo com a auditoria, o Exército também liberou armas de fogo para 2.690 pessoas com mandados de prisão em aberto. A informação foi divulgada inicialmente pelo jornal O Estado de S. Paulo, e a reportagem também teve acesso ao documento.

Os técnicos da corte de contas concluíram que o Exército falhou em suas atribuições ao apontar "sérias fragilidades" na fase de comprovação da idoneidade de quem obteve ou renovou o registro de CAC.

Faltou também, segundo os auditores, "rotina regular de monitoramento periódico" para identificar irregularidades nos registros em vigor.

Para ter acesso a arma de fogo de uso permitido, o interessado deverá, segundo o Estatuto do Desarmamento (lei nº 10.826, de 2003), apresentar certidões negativas de antecedentes criminais e atestar não estar respondendo a inquérito policial ou a processo criminal, além de documento comprobatório de ocupação lícita, de residência certa e de filiação a entidade de tiro ou caça.

As fragilidades identificadas pelos técnicos do TCU seriam decorrentes, de acordo com o relatório, da própria legislação -por não prever, por exemplo, a periodicidade com que a comprovação de idoneidade deve ser feita- ou da "não utilização pelo Exército de todas as ferramentas disponíveis à Administração e da falta de atuação conjunta de diferentes órgãos e entes federativos".

"A concessão, a revalidação e o não cancelamento de CRs [certificados de registro] vinculados a pessoas que não atendem aos critérios de idoneidade possibilita o acesso delas a armas de fogo e munições, representando um risco à segurança pública", disseram os auditores.

Por meio do Centro de Comunicação Social, o Exército afirmou que, após o relatório da auditoria do TCU, foram enviadas "considerações àquele Tribunal e vem adotando todas as medidas cabíveis para aperfeiçoar os processos de autorização e fiscalização dos CAC".

"Cabe ressaltar que ao tomar conhecimento de qualquer irregularidade, como perda de idoneidade ou falecimento, do CAC são adotadas, imediatamente, as providências necessárias, inclusive com a possível suspensão dos Certificado de Registro (CR)", afirmou a Força.

As acusações que levaram CACs aos bancos dos réus e à condenação somam 6.380 casos, com destaque para condutas previstas no Estatuto de Desarmamento.

Foram 2.115 registros (33,2% do total), incluindo "porte ilegal de arma de fogo de uso permitido", "posse ou porte ilegal de arma de fogo de uso restrito" ou "disparo de arma de fogo".

O crime de lesão corporal apareceu em segundo lugar no ranking, com 451 situações (7%), e o tráfico de drogas foi o terceiro tipo penal mais frequente, com 324 ocorrências (5%).

A listagem feita pelo TCU trouxe ainda os crimes de ameaça, com 267 registros (4,2%); de roubo, com 190 situações (3%), e de homicídio, com 180 casos (2,8%).

No levamento do tribunal foram cruzadas informações do Sigma (Sistema de Gerenciamento Militar de Armas de Fogo) com bases de dados da Justiça, como o Sistema Eletrônico de Execução Unificado e o Banco Nacional de Mandados de Prisão.

Em 2022, segundo mostra a Folha de S.Paulo, o Exército aprovou registro de CAC para um membro da facção criminosa PCC (Primeiro Comando da Capital) a partir dos documentos apresentados por ele. Após esse processo, o suspeito teve autorização para comprar um fuzil.

Na ocasião, a Força disse, por meio de nota, que usou a autodeclaração de idoneidade e a certidão criminal do Tribunal de Justiça de Minas Gerais para a análise e que a responsabilidade pela documentação é do "interessado".

A equipe de auditoria do TCU destacou ainda no relatório a importância de se aprimorar os processos e os controles preventivos para que não seja demandado da administração pública "um esforço para localizar e apreender o acervo do indivíduo identificado inidôneo".

O controle prévio "mitiga esse esforço ao impedir que pessoas que não atendam aos critérios para comprovar sua idoneidade tenham acesso a novas armas", afirmaram.

No nota enviada à reportagem nesta segunda-feira, o Exército afirmou que pauta sua atuação dentro da legalidade e transparência sempre atendendo as solicitações de esclarecimentos, além respeitar todas as imposições de sigilo impostas por outros órgãos.

Toda a responsabilidade por CACs, clubes de tiro e lojas de armas está em processo de transferência do Exército à Polícia Federal, previsto para ser concluído em 1º de janeiro.

O governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) concluiu que houve falha dos militares em suas atribuições relacionadas e decidiu promover a migração.

Setor da PF que assumirá o serviço vê a atual estrutura da corporação como insuficiente para o volume de trabalho que surgirá com a atribuição de fiscalizar os CACs.


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