Judicialização
Na opinião de Leiliane Rebouças, criadora do movimento social Guardiões de Brasília Patrimônio Humanidade, haverá demandas à Justiça contra a lei do PPCUB. “Vai ter que ser judicializado porque é dever do Estado preservar o patrimônio histórico artístico cultural nacional. É óbvio que se essa lei local se choca com a lei federal, coloca em risco o tombamento. Não podem fazer uma lei local que vai contra a lei federal do tombamento”, diz se referindo à Portaria nº 314/1992 do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan).
“O tombamento nacional e o título de Patrimônio Cultural foram feitos para proteger Brasília da especulação imobiliária que existe desde que a cidade surgiu”, lembra. Ela acredita que o PPCUB é ameaça ao título de Patrimônio Histórico e Cultural de Brasília. “Esse título agrega valor à cidade, mostra que Brasília é uma cidade única no mundo. Um bom governo utiliza esse título para desenvolver o turismo”, recomenda.
Leiliane Rebouças ainda acrescenta que o PPCUB tem falhas de diagnóstico. “Nem estudo de impacto ambiental e de trânsito foram feitos”. O professor Frederico Flósculo, da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo (FAU) da Universidade de Brasília (UnB), toca no mesmo ponto. “Não existe planejamento urbano sem diagnóstico, não existe planejamento urbano sem estudos de impacto de toda ordem, impacto ambiental, impacto populacional, social, de segurança e de trânsito”, avalia.
Ele chama o PPCUB de “plano provinciano”, que desconsidera a vocação da cidade. “A primazia é de abrigar os Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário federal. Não há o menor estudo sobre as necessidades futuras de ocupação de espaço, de reorganização de nenhum dos Poderes da República”.
Participação social
Apesar da gestação de 15 anos do PPCUB e das dezenas de audiências públicas realizadas sobre o plano, o professor da UnB e a ativista do Guardiões de Brasília reclamam da falta de efetiva participação social na elaboração da proposta. Esse ponto também é tido como principal por Ludmila Correia, coordenadora da Comissão de Política Urbana e Ambiental do Conselho de Arquitetura e Urbanismo do Distrito Federal (CAU/DF) e professora de política urbana e planejamento urbano do Instituto Brasileiro de Ensino, Desenvolvimento e Pesquisa (IDP).
“Existe a necessidade de se pensar o desenvolvimento urbano, mas que ele seja compatível com a questão da preservação do patrimônio. Isso precisa ser feito não só com muito cuidado técnico, mas especialmente com participação social, para que essas diferentes visões que existem na cidade sejam reconhecidas”, defende a coordenadora.
Visão próxima tem o arquiteto Juliano Carvalho, coordenador do Conselho Internacional de Monumentos e Sítios (Icomos), um órgão não governamental internacional, que assessora a Unesco para as questões relativas ao patrimônio da humanidade. “O PPCUB prevê vários planos e projetos. É importante que a sociedade participe de cada um desses planos e projetos que ainda não estão elaborados para garantir a nossa qualidade de vida enquanto moradores.”
A ausência da população na implementação do plano preocupa o geógrafo Telmo Amand Ribeiro, diretor do Instituto Histórico e Geográfico do Distrito Federal (IHGDF). “Fazem um chamamento formal à sociedade, uma coisa pouco divulgada, e as pessoas não participam.”
O secretário Marcelo Vaz rebate as queixas quanto à falta de participação e defende que houve “participação popular maciça e suficiente”na elaboração do PPCUB. “Pessoas que representam a sociedade civil participaram de toda a construção do processo. A gente ouviu uma série de atores, desde o mercado imobiliário até associações de moradores. Mas há quem queira que a gente ouça toda a população. Não conseguimos fazer isso, temos que fazer as oitivas por amostragem.”
Degradação e desigualdade
Para o geógrafo Telmo Amand, é possível Brasília se modernizar e tornar-se mais importante sem mudar suas principais características urbanísticas. “Mas essa cidade pode se efetivar como capital nacional, como cidade global, trazer grandes eventos, grandes eventos internacionais, mantendo a estrutura fundamental do Conjunto Urbanístico.”
Juliano Carvalho avalia que o PPCUB é um documento híbrido, com pontos negativos e positivos. Mas não é possível falar em perda do título da Unesco de Patrimônio Histórico e Cultural por causa do plano. O arquiteto, no entanto, alerta que a cidade de Brasília “tem processos crônicos de degradação ações anteriores”, e a perda do título “pode acontecer ao longo das décadas se a cidade continuasse degradando.”
O professor emérito da UnB Frederico Holanda, pesquisador associado da FAU, acrescenta outras preocupações como a desigualdade e a exclusão social de Brasília, “talvez a mais excludente de todas as cidades brasileiras”, agravadas no PPCUB quando possibilita a “privatização da orla do Lago Paranoá”, critica com a destinação de terrenos para a construção de hotéis como ocorre no Trecho 4 do Setor de Clubes Esportivos Sul.
Indagado a respeito, o secretário Marcelo Vaz explicou que os lotes já existiam, não foram criados pelo PPCUB. “O que a gente fez foi dar um tratamento equânime a todos os oito lotes. Isso porque a Portaria nº 166/2016 do Iphan, que define critério de preservação, permite que naquele trecho, e unicamente naquele trecho do setor de clubes, sejam instalados hotéis e aparte hotéis.”
Regulamentação
O decreto para regulamentar o PPCUB já foi encaminhado pelo GDF para avaliação do Iphan. A autarquia acompanha desde 2009 a elaboração do plano e emitiu pareceres técnicos com análises, interpretações e recomendações e também participou de audiências públicas sobre a proposta antes de virar lei.
Após a regulamentação do PPCUB, a Secretaria de Desenvolvimento Urbano e Habitação deve concluir a elaboração do Plano Diretor de Ordenamento Territorial (PDOT) com diretrizes gerais de expansão urbana e zoneamento. Delimitando o que é área urbana, o que é área rural, o que é passível de regularização, onde que é a área para oferta habitacional.
Em 21 abril do próximo ano, Brasília completará 65 anos de inauguração. Em breve, ultrapassará o tempo que o Rio de Janeiro teve como capital da República (70 anos). A palavra "república", que designa a forma de governo com participação direta e eleição de representantes, deriva do latim res publica traduzido como “coisa pública”, como é o Conjunto Urbanístico da capital federal.
Tags:
Brasília | plano urbanístic | PPCUB
Entre na comunidade de notícias clicando
aqui no Portal Acessa.com e saiba de tudo que acontece na Cidade, Região, Brasil e Mundo!