SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - A estratégia da campanha de Jair Bolsonaro (PL) de atacar religiões de matriz africana em uma ofensiva contra Luiz Inácio Lula da Silva (PT) pode ter um efeito negativo sobre parte do eleitorado do próprio presidente, segundo o advogado Hédio Silva Júnior, coordenador-executivo do Instituto de Defesa dos Direitos das Religiões Afro-Brasileiras (Idafro).
"Ainda há um número inestimado de macumbeiros que têm simpatia pelo Bolsonaro", afirma o dirigente do instituto, que classifica a estratégia como um tiro no pé. "O feitiço pode virar contra o feiticeiro", segue.
Para ele, ataques direcionados à umbanda e ao candomblé como tática de campanha subestimam não apenas os apoiadores do presidente, como também o número de adeptos de religiões afro-brasileiras no país.
Segundo o advogado, é possível que o total de praticantes de religiões afro-brasileiras ultrapasse os 3% aferidos pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), uma vez que, diante do cenário de intolerância, muitos ainda têm receio de admitir a sua fé para os censores.
"Só no Rio Grande do Sul são 60 mil terreiros de batuque contabilizados. Em média, cada terreiro tem 50 adeptos. Nós estamos falando de 3 milhões de macumbeiros no Rio Grande do Sul", afirma o advogado, que está finalizando o livro "Racismo Religioso: Histórico e Uso Político do Ódio ao Legado Civilizatório Africano". A obra deve sair pela editora Dialética ainda neste ano.
Como mostrou a coluna na sexta-feira (12), estrategistas do governo e da campanha de Bolsonaro estudam levar ataques à esposa de Lula, a socióloga Rosângela da Silva, para a televisão. A ideia é explorar imagens de Janja, como ela é conhecida, que teriam o potencial de afetar negativamente o eleitorado evangélico, especialmente as mulheres.
Uma fotografia caiu "como uma bomba" no grupo mais próximo do presidente, segundo um de seus integrantes relatou à coluna. Nela, Janja aparece de branco ao lado de imagens como a de Xangô, um dos orixás da umbanda e do candomblé, e diz ter "saudades de vestir branco e girar".
Lula é reconhecidamente católico praticante. Se casou três vezes na na igreja, com a bênção de um padre, é amigo de diversas lideranças religiosas e pediu uma missa antes de ser preso, em 2018. Ainda assim, estrategistas de Bolsonaro acreditam que podem desgastá-lo com a narrativa de que a mulher se dedica a rituais de "macumba".
Se veiculada, a propaganda poderia ser enquadrada como crime de praticar, induzir ou incitar a discriminação religiosa, de acordo com Hédio Silva Júnior.
Tirar votos de Lula entre as mulheres evangélicas virou prioridade absoluta do bolsonarismo. O presidente abre larga vantagem sobre o petista entre os homens da religião, vencendo hoje com 48% contra 28%, segundo o Datafolha.
Já entre as mulheres evangélicas a situação é de empate: 29% para Bolsonaro e 25% para Lula. E 34% delas dizem ainda não saber em quem vão votar.
A primeira-dama Michelle Bolsonaro já postou em suas redes vídeo contra Lula que associa religiões de matriz africana a "trevas".
Apesar dos ataques, para o coordenador-executivo do Idafro as eleições deste ano serão marcadas pela "oportunidade que a macumba nunca teve para demonstrar a sua força política".
Como mostrou a coluna nesta segunda-feira (15), o PT está lançando uma ofensiva para desmentir rumores de que Lula fechará igrejas evangélicas no país.
A coordenação da campanha do petista vem recebendo relatos de diversas localidades sobre fake news espalhadas até mesmo dentro de templos afirmando que o petista perseguirá religiosos e não permitirá que elas sigam funcionando.
O partido lembra que ele sancionou a lei da liberdade religiosa, em 2003, e a lei que criou o Dia da Marcha para Jesus, em 2009.
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