SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Para o pastor batista Oliver Goiano, da coordenação do Núcleo Evangélico do PT, líderes evangélicos que apoiaram Luiz Inácio Lula da Silva no passado e hoje se converteram ao bolsonarismo "deveriam ficar no banco" no próximo governo petista.
"Todos esses pastores midiáticos que se voltaram contra nós tiveram ovelhas que votaram em nós", afirma. "Não podemos dar de novo poder aos que querem uma teocracia evangélica no Brasil."
Goiano chama Lula de "nosso Nelson Mandela" e vê preconceito tanto de progressistas com evangélicos quanto vice-versa. "Da esquerda, achando que todo evangélico é acrítico, manipulável. Do evangélico, achando que toda esquerda quer destruir a família e é ateísta."
PERGUNTA - Lula ganhou este pleito, mas com forte oposição evangélica, um segmento que já o apoiou. Por que acha que esse apoio esmoreceu?
OLIVER GAIANO - A gente não consegue responder essa pergunta sem analisar o movimento conservador que existe no mundo nos últimos 20 anos. Em alguns lugares, ele teve face de fundamentalismo. A eleição do Bolsonaro está de mãos dadas com a eleição de Donald Trump, o Brexit, o poder das mídias sociais.
Realmente, o público evangélico nos apoiou no passado. Creio que Lula venceu por um milagre de Deus, porque enfrentamos a máquina do ódio, toda a força do Estado contra nós. Enfrentamos tentativas de golpe, com servidores públicos [da Polícia Rodoviária Federal] fazendo blitze nos estados maiores do que as feitas no primeiro turno. Ganhamos também pelo fenômeno que Lula é. Se fosse [João] Doria, Ciro [Gomes], todo mundo perderia para o Bolsonaro. E vencemos por causa do Nordeste, região com a maior alfabetização política.
P.- A esquerda sabe dialogar com evangélicos?
OG- Na minha sincera opinião, ela está aprendendo agora. No momento em que o PT nasce, 90% da população era católica. Nosso partido não conseguiu perceber que os evangélicos cresceram de maneira exponencial. Lula, preso em Curitiba, foi assistir a programas de TV e descobrir esse Brasil profundo. Disse que ficou assustado com a agressividade de alguns pastores. Ele percebeu, "olha, ali está uma força evangélica, há maravilhosos pastores, há pastores que oprimem o rebanho, mas o povo evangélico tem sido agrilhoado e preso por alguns pastores que são inclusive falsos profetas".
Posso dizer que, de 2018 para cá, nosso diálogo com evangélicos melhorou muito, mas ainda está longe de ser ideal. Há um preconceito de ambos os lados. Da esquerda, achando que todo evangélico é acrítico, manipulável. Do evangélico, achando que toda esquerda quer destruir a família e é ateísta.
P.- Como fazer para abaixar a resistência ao PT nas igrejas?
OG- Lula, na carta que fez aos evangélicos, já deu o recado. Precisamos convidar a igreja a governar conosco. Já temos muitos temas comuns ao Estado e à igreja, como combater a pobreza, afastar jovens das drogas, investir em educação. Vamos lembrar que, quando missionários vieram ao Brasil, a primeira coisa que fizeram foi fundar escolas.
P.- O sr. acha que Lula precisa buscar o diálogo com pastores de expressão nacional que já o endossaram, mas hoje estão com Bolsonaro?
OG- Vou usar um termo evangélico. Na minha visão, esses pastores deveriam ficar no banco. Foi muita mentira dita contra nós. Eles sabiam que era mentira. Lula quer dialogar com o povo da igreja. A gente sabe fazer diferença entre uma cúpula que se vendeu ao fundamentalismo religioso e o povo.
Todos esses pastores midiáticos que se voltaram contra nós tiveram ovelhas que votaram em nós. Lula não está com espírito vingativo, ele saiu daquela prisão injusta para pacificar o país, é o nosso Nelson Mandela. Mas entendo que nós precisamos empoderar pastores conservadores simpáticos a Lula ou progressistas. Se chamarmos de novo esses pastores midiáticos, na primeira crise eles vão embora. Não podemos dar de novo poder aos que querem uma teocracia evangélica no Brasil.
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