BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) - Pessoas próximas ao presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT) veem a saída da vice-procuradora-geral da República, Lindôra Araújo, como condição necessária para a abertura de diálogo entre o novo governo e o procurador-geral da República, Augusto Aras.

O segundo mandato de Aras à frente da PGR (Procuradoria-Geral da República) vai até setembro de 2023, quando Lula poderá indicar um nome. Até lá o presidente eleito -que será diplomado nesta segunda-feira (12) pelo TSE (Tribunal Superior Eleitoral)- terá de conviver com o nome escolhido por Jair Bolsonaro (PL).

Ainda em novembro, representantes do petista fizeram um primeiro contato com integrantes do gabinete do procurador-geral, na tentativa de articular um encontro. Contatada pela Folha de S.Paulo, a PGR não se manifestou sobre o assunto.

Embora Aras também tenha a imagem atrelada ao atual presidente da República, Lindôra é vista como mais bolsonarista e próxima da família, razão pela qual seu nome desagrada ao governo eleito.

São lembradas, por exemplo, as manifestações da representante da Procuradoria contra o uso de máscaras na pandemia e pelo arquivamento de um conjunto de apurações sobre crimes atribuídos pela CPI da Covid a Jair Bolsonaro e a alguns de seus auxiliares.

Mais recentemente, Lindôra opinou favoravelmente às emendas de relator, instrumento utilizado por Bolsonaro para obter apoio no Congresso, em julgamento iniciado no STF (Supremo Tribunal Federal) e com previsão de ser retomado na quarta-feira (14).

Em outra ação, ela foi contra um pedido formulado pelo Ministério Público de Mato Grosso ao STF para que medidas mais drásticas fossem adotadas contra apoiadores do presidente que, inconformados com resultado das urnas, promovem atos antidemocráticos naquele estado.

O ministro Alexandre de Moraes, relator do caso na corte, desconsiderou os argumentos da vice-procuradora-geral e impôs, entre outras medidas, multa de R$ 100 mil a proprietários de mais de uma centena de veículos usados em atos antidemocráticos, a maioria caminhões.

Diante do teor dessas manifestações, o entorno de Lula considera que a permanência de Lindôra em cargo estratégico na PGR inviabiliza o diálogo com a cúpula da instituição.

A vice-procuradora-geral atua em matéria penal junto ao Supremo e, mantida no cargo, poderá eventualmente requerer a abertura de inquéritos contra integrantes do futuro governo. Um caso que envolve Lula, inclusive, já está sob a análise dela.

Bolsonaro pediu a abertura de ação penal contra o presidente eleito e contra a deputada e presidente nacional do PT, Gleisi Hoffmann. O presidente acusa os adversários de crimes contra sua honra, supostamente cometidos durante a campanha eleitoral.

A representação do Palácio do Planalto foi enviada inicialmente ao Ministério da Justiça ainda em outubro, que a repassou à Polícia Federal.

No final de novembro, o diretor-geral da corporação, Márcio Nunes de Oliveira, despachou o caso ao Supremo e pediu que "seja feita apreciação do foro competente para processo e julgamento, bem como para eventual autorização de instauração de inquérito policial".

O documento foi distribuído ao ministro Kassio Nunes Marques, indicado por Bolsonaro à corte. Na semana passada, Kassio pediu à PGR um parecer. Os autos foram entregues a Lindôra.

Apesar da preocupação com a vice-procuradora-geral, integrantes da equipe de transição responsável pelo tema não veem a sucessão na PGR como prioridade, já que o foco dos grupos temáticos está nos cem primeiros dias de governo. Mas o órgão preocupa a cúpula petista.

A PGR denunciou ao Supremo importantes nomes do PT em dois escândalos: no mensalão, a compra de apoio parlamentar no primeiro mandato de Lula; e no petrolão, o esquema de corrupção apontado pela Operação Lava Jato na gestão Dilma Rousseff.

Por esse motivo, a forma de escolher o chefe da instituição é alvo de discussões no governo de transição. Na campanha eleitoral, Lula não se comprometeu a respeitar a lista tríplice.

Nos governos petistas, a escolha foi sempre do primeiro colocado da lista, elaborada a partir de uma votação interna organizada pelos procuradores da República.

A participação na Lava Jato e nomes não palatáveis ao PT, porém, podem afastar do posto máximo da instituição alguns nomes mesmo que no topo da preferência interna.

Esse é o caso de Nicolau Dino, que chegou a ser o primeiro colocado na lista elaborada durante a gestão Michel Temer (MDB), que o preteriu pela segunda colocada, Raquel Dodge.

Embora seja irmão do senador eleito e futuro ministro da Justiça, Flávio Dino (PSB-MA), Nicolau tem contra ele a proximidade com o chefe da PGR no auge da Lava Jato, Rodrigo Janot.

Caso não respeite a lista e escolha um novo procurador-geral sem passar pelo crivo da classe, Lula seguirá o exemplo de Bolsonaro, que quebrou a tradição inaugurada há 20 anos pelo petista.

O presidente escolheu quem sucederia a Dodge no comando do Ministério Público Federal no primeiro ano do seu mandato. Ele ignorou os nomes sugeridos pelos procuradores e indicou Aras, repetindo a opção em 2021 --o mandato de PGR é de dois anos.

"Já estou apanhando da mídia. Esse é um bom sinal, sinal que a indicação nossa é boa", disse Bolsonaro em 2019.


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