SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Diversas entidades e ONGs de direitos humanos repudiaram a ação do governo do presidente Jair Bolsonaro (PL) de extinguir a CEMDP (Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos).

As organizações afirmaram que a comissão é prevista pela Constituição Federal e que ainda não cumpriu sua tarefa legal em totalidade, sendo o movimento um ataque à memória das vítimas da ditadura militar, que vigorou entre 1964 e 1985.

O Instituto Vladimir Herzog, organização brasileira de defesa dos direitos humanos, disse em nota que o fechamento do órgão é uma tentativa de acobertar os crimes do regime autoritário que vigorou no país.

A organização classificou o fim do colegiado como uma tentativa de Bolsonaro de tumultuar o cenário político nacional a 15 dias da posse de Luiz Inácio Lula da Silva (PT), presidente eleito.

Já a Anistia Internacional, ONG internacional de direitos humanos, afirmou que a extinção da comissão é um retrocesso e uma ameaça ao processo de justiça de transição brasileira, com violações de direitos à verdade, à justiça e à reparação das vítimas e familiares delas.

Também lembrou sentença da Corte Interamericana de Direitos Humanos contra o Estado brasileiro que obriga o país a apurar, processar e responsabilizar autores dos crimes cometidos no regime militar, além do reconhecimento das violações de direitos humanos do período como crimes contra a humanidade.

A Conectas Direitos Humanos ressaltou o caráter da votação pela extinção da comissão --todos os favoráveis são aliados do presidente Bolsonaro.

Ariel de Castro Alves, advogado e presidente do Grupo Tortura Nunca Mais, disse que o fim do colegiado é uma afronta à história do Brasil e aos familiares das vítimas mortas e desaparecidas pela ditadura militar, e que o ato visa atender anseios e interesses dos militares.

"Faz parte da conjuntura de discursos e declarações dele e de parte dos militares, que absurdamente defendem que não houve ditadura, contrariando todos os fatos", comentou.

A CEMDP foi criada em 1995, no governo de Fernando Henrique Cardoso (PSDB), e buscava reconhecer pessoas mortas ou desaparecidas em razão de atividades políticas na ditadura militar, além de localizar corpos e realizar indenizações aos familiares.

O órgão, vinculado ao Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, foi extinto na manhã da última quinta-feira (15), duas semanas antes do fim do mandato do atual presidente.

Votaram favoravelmente Marco Vinicius Pereira de Carvalho, presidente da comissão, além do deputado federal Filipe Barros (PL-PR), representante da Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados, Jorge Luiz Mendes de Assis, representante das Forças Armadas, e Paulo Fernando Melo da Costa, representante da sociedade civil.

Todos foram nomeados por Bolsonaro, já que o Executivo poderia nomear quatro dos sete integrantes.

Uma semana antes, o MPF (Ministério Público Federal) recomendou a reprovação da extinção do grupo, alegando que as competências do colegiado, previstas em lei, ainda não tinham sido esgotadas.

O fim da comissão era um dos planos de governo de Bolsonaro, sendo quase encerrado em junho deste ano, quando foi marcada reunião com a alegação de que houve "a conclusão da análise de todos os processos de solicitação de indenizações". A decisão foi adiada para este mês.

Capitão reformado do Exército, o presidente é um defensor da ditadura e homenageou em seu voto em favor do impeachment da então presidente Dilma Rousseff (PT), torturada pelo regime, o coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra, um dos principais símbolos da repressão do período.

Marco Vinicius Pereira de Carvalho, presidente do colegiado e advogado bolsonarista, foi ex-assessor de Damares Alves e tentou pautar o fim do órgão ainda em 2019, sem sucesso.

O Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos declarou, em nota, que a busca por desparecidos não termina com o fim do grupo e que todos os processos judiciais em curso, dos quais a União é parte, continuam em andamento.


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