SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - A Marinha do Brasil indicou para integrar sua cúpula um almirante considerado bolsonarista raiz, o comandante do 1º Distrito Naval, Eduardo Vazquez.

A Força foi a que mais apresentou resistência à eleição de Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que derrotou Jair Bolsonaro (PL) em outubro do ano passado. Seu então comandante, Almir Garnier, se recusou a participar da passagem de comando para o sucessor, Márcio Sampaio Olsen.

Durante a transição, Garnier não aceitou conversar com o então futuro ministro da Defesa, José Múcio. Saiu do cargo no dia 31 de dezembro, quando acabou o governo Bolsonaro, deixando Olsen interinamente na chefia até sua posse, em 5 de janeiro.

Garnier almoçou com membros da cúpula da Força depois, para tentar desfazer o mal-estar e para apresentar suas razões para a insubordinação.

A decisão do Almirantado, colegiado com dez integrantes liderado pelo comandante da Força, foi tomada na segunda (13). Vazquez é o único com promoção sugerida a almirante de esquadra, com quatro estrelas, o topo da hierarquia. Há outros 12 nomes na lista, para os cargos de contra-almirante (duas estrelas) e vice-almirante (três estrelas).

Sua indicação ocorreu um dia antes de um almoço entre a cúpula da Marinha com Lula, mediado por Múcio, que visava distensionar a relação dos almirantes com o petista. O presidente é o responsável pela aprovação, por decreto, das promoções decididas pelos Alto-Comandos das três Forças.

Logo depois, como a Folha mostrou, foi enviado um comunicado interno pedindo que qualquer militar que seja filiado a partido político deixe a agremiação. Fardados não podem ser integrantes de siglas, mas levantamento da Marinha mostrou que havia casos na Força. A iniciativa foi lida no Planalto como um sinal de conciliação e despolitização por parte dos almirantes.

A Folha procurou Vazquez na manhã desta quinta (16). Assessoria do seu comando pediu perguntas por escrito, que foram enviadas, mas até a conclusão deste texto não houve resposta.

Ele ocupa o prestigioso comando no Rio de Janeiro, o mais tradicional da Marinha, e é bastante próximo do almirante Flávio Rocha, que já chefiou a unidade e foi o secretário de Assuntos Estratégicos do Planalto sob Bolsonaro.

Vazquez é conhecido entre seus colegas como dono de opiniões fortes e antipetismo, tendo apoiado internamente Garnier. Segundo esses conhecidos, ele era simpático aos manifestantes contrários à posse do petista acampados em frente a quartéis do Exército pelo Brasil, mas não há relato de comentários seus sobre os atos golpistas do dia 8 de janeiro.

Diferentemente de outros militares, ele não tem vida ativa em redes sociais. É respeitado em seu meio: ocupou o comando da Força-Tarefa Marítima da Unifil, a missão da ONU que patrulha as águas em torno do Líbano, e substituiu Rocha como chefe de gabinete do Comando da Marinha antes de ir para o Rio no ano passado.

Decidir sobre sua indicação é mais um nó para Lula com os fardados. Além da turbulenta transição, quando comandantes da Força Aérea e do Exército também cogitaram deixar o governo com Bolsonaro sem passar o cargo aos sucessores, há o espinho na garganta do 8 de janeiro.

O episódio, que contou com ao menos leniência de militares que deveriam proteger a sede do Executivo, se não com apoio direto aos golpistas, é uma das maiores fontes de contrariedade do presidente. Ele já prometeu que qualquer fardado cuja participação seja comprovada nas apurações judiciais do caso será punido exemplarmente.

No Exército, houve ainda o agravante de que o novo comandante, Julio César Arruda, não aceitou barrar a promoção do ex-ajudante de ordens de Bolsonaro, Mauro Cid. Isso acabou por derrubar o general, substituído por Tomás Ribeiro Paiva em janeiro.

O novo chefe tem feito um trabalho interno de despolitização, com ordens expressas para o fim de manifestações, golpistas ou não, em redes sociais. Cid, que ora estrela o noticiário das joias da Arábia por ter tentado recuperá-las para Bolsonaro, teve a indicação para a principal unidade de Forças Especiais do país suspensa. O Exército soma cerca de 60% dos 360 mil militares do Brasil.


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