BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) - O ministro Luís Roberto Barroso enfrenta desgaste com decisões criticadas por movimentos feministas e por ativistas contra os supersalários no serviço público após 50 dias à frente do STF (Supremo Tribunal Federal) e do CNJ (Conselho Nacional de Justiça).

O início da gestão do magistrado à frente da cúpula do Poder Judiciário também ficou marcado por uma aproximação com o governo Lula (PT) e pela interrupção do debate de temas sensíveis pautados pela antecessora, Rosa Weber.

Em sua primeira sessão como presidente do CNJ, o órgão aprovou uma resolução que abre caminho para a criação de diversos penduricalhos à remuneração de magistrados de todo o país.

O ministro, que já chamou os supersalários que extrapolam o teto constitucional de "desaforo", foi favorável à medida. A resolução garante a equiparação de "direitos e deveres" de juízes e integrantes do Ministério Público.

Poucos dias depois da decisão, um benefício já foi criado pelo CJF (Conselho da Justiça Federal) com base nessa resolução. Esse benefício pode aumentar a remuneração de parte dos juízes federais em cerca de um terço.

O CJF é chefiado pela presidente do STJ (Superior Tribunal de Justiça), Maria Thereza de Assis Moura. O órgão concedeu aos juízes compensação financeira ou até dez folgas mensais.

Segundo essa medida, juízes que acumulem funções administrativas ou outras atividades "processuais extraordinárias" terão direito a uma "licença compensatória na proporção de 3 dias de trabalho para 1 de licença, limitando-se a dez dias por mês".

Os magistrados que não desejarem tirar essas folgas vão receber por elas. O tribunal deve pagar esses valores por meio de indenização, sem incidência do Imposto de Renda.

Na prática, a decisão do CNJ pavimentou o caminho para que parte dos juízes federais possa receber um valor de cerca de 30% do seu salário bruto mensal com esse penduricalho.

Além disso, juízes do trabalho e tribunais estaduais já iniciaram o movimento para aprovar medida similar. O possível efeito cascata da decisão do CNJ acendeu sinal amarelo na cúpula dos tribunais do país, inclusive os superiores, porque pode ter grande impacto no orçamento dos próximos anos.

O CNJ também julgou o caso do juiz Rudson Marcos, da Justiça de Santa Catarina. O conselho aplicou a pena de advertência, a mais leve prevista na Lei Orgânica da Magistratura, pela condução de uma audiência da influenciadora Mariana Ferrer, em 2020.

Na ocasião, Mariana foi humilhada pelo advogado Cláudio Gastão da Rosa Filho, que defendia o empresário André de Camargo Aranha, acusado de estuprá-la em dezembro de 2018. O juiz do caso hesitou em evitar a humilhação.

Movimentos feministas exigiam a imposição de uma sanção mais dura contra o magistrado. O representante da PGR (Procuradoria-Geral da República) no conselho, subprocurador José Adonis Callou, seguiu essa linha, mas os conselheiros discordaram.

A relatora, conselheira Salise Sanchotene, afirmou que não há dúvidas do cometimento da falta funcional pelo juiz, "notadamente pela omissão em frear questionamentos descabidos dirigidos à vítima do processo".

Barroso seguiu o entendimento. Callou, porém, havia se manifestado pela aplicação de uma sanção mais grave, a remoção compulsória, "para que o magistrado possa trabalhar em uma vara que seja mais adequada ao seu perfil".

Callou disse que a audiência representou "tudo de como não devem conduzir os agentes que participam de um ato processual dessa natureza" e que Marcos "não tem um perfil adequado para presidir audiências de natureza criminal".

Imagens da audiência foram divulgadas em 2020 pelo site The Intercept Brasil e o caso ganhou grande repercussão. Aranha acabou absolvido naquela ação penal e também em segunda instância.

No STF, por sua vez, Barroso evitou temas polêmicos neste início de gestão. Antes de se aposentar, a ministra Rosa Weber levou a julgamento a ação que discute a descriminalização do aborto até a 12ª semana de gestação. O voto da ministra a favor da tese causou alvoroço no mundo político e uma forte reação no Senado Federal.

Barroso, na sequência de Rosa, apresentou um pedido de destaque, levando o tema ao plenário presencial para que futuramente ele seja discutido entre os ministros.

O magistrado, porém, não pretende concluir a análise do tema tão cedo, em um movimento interpretado nos bastidores como uma tentativa de manter uma relação pacífica com o Legislativo.

"Não há nenhuma previsão para marcar o julgamento sobre a descriminalização do aborto até o terceiro mês de gestação. Entendo que esse é um tema que ainda precisa de mais debate na sociedade", afirmou Barroso à coluna Mônica Bergamo, da Folha, em outubro.

O ministro também tem priorizado manter uma boa relação com o Poder Executivo. No início de novembro, mudou seu voto sobre a correção do FGTS (Fundo de Garantia por Tempo de Serviço) pela remuneração da poupança a partir de 2025, e não mais a partir do ano que vem.

Segundo o ministro, não haveria tempo de adequar a regra ao Orçamento de 2024. O magistrado disse ter levado em conta argumentos da Caixa e do ministro da Fazenda, Fernando Haddad.

A poupança rende hoje 6,073% ao ano, enquanto o FGTS é corrigido em 3% ao ano mais TR (Taxa Referencial).

Questionado pela Folha, o ministro afirmou que a medida aprovada pelo CNJ não representará aumento de custos e que "qualquer pagamento precisa ser feito com remanejamento de gastos". Também disse que a "equiparação dos juízes com integrantes do Ministério Público está na Constituição".

"Outra justificativa para a efetivação da equiparação é o fenômeno de êxodo da carreira, principalmente na Justiça Federal: tem ocorrido aposentadorias precoces, mudanças para outras carreiras dentro do direito, saídas para advocacia privada."

Via assessoria, Barroso também afirmou que o juiz do caso de Ferrer já havia sido afastado de vara criminal e que a punição "deve ter caráter educativo e não de vingança". "Foi passada uma mensagem clara para todos os juízes sobre a importância de ter sensibilidade e empatia ao lidar com casos de violência sexual."

Sobre o voto do caso do FGTS, Barroso declarou que não mudou de voto, mas considerou a aprovação do arcabouço fiscal e que "dificilmente" o julgamento seria concluído neste ano para prever a "incidência do novo critério para os depósitos feitos após 2025".


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