SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - A Polícia Federal indiciou o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), o ex-ajudante de ordens Mauro Cid, o deputado federal Gutemberg Reis (MDB-RJ) e mais 14 pessoas no caso que apura a falsificação de certificados de vacinas de Covid-19.

Eles foram indiciados sob suspeita pelos crimes de inserção de dados falsos em sistema público e associação criminosa.

A pena para associação criminosa é a reclusão de 1 a 3 anos. Já a inserção de dados falsos em sistema de informações tem pena de reclusão de 2 a 12 anos e multa.

Essa investigação está vinculada ao inquérito das milícias digitais, que tramita em sigilo no STF (Supremo Tribunal Federal) sob a relatoria do ministro Alexandre de Moraes. Foi no âmbito deste inquérito que foi feito o acordo de delação premiada do ex-ajudante de ordens de Bolsonaro Mauro Cid.

No ano passado, Bolsonaro disse em depoimento à Polícia Federal que não determinou a inserção de dados falsos na carteira de vacinação. Ele também afirmou que só teve conhecimento da adulteração quando esse tema começou a ser divulgado pela imprensa.

Veja o passo a passo que teria resultado na falsificação do cartão de vacinação do ex-presidente.

CID PEDE AJUDA PARA FALSIFICAR CARTÃO DA ESPOSA

Segundo a PF, o tenente-coronel Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro, pediu ajuda ao sargento Luis Marcos dos Reis, outro ajudante de ordens, para conseguir um cartão de vacinação preenchido com doses da vacina contra a Covid-19 em nome de sua esposa, Gabriela Santiago Cid.

Com ajuda do sobrinho, o médico Farley Vinicius Alcantara, Reis teria obtido um cartão da Secretaria de Saúde de Goiás em nome de Gabriela.

Os dados da vacina (data, lote, fabricante e aplicador), de acordo com as mensagens de WhatsApp identificadas pela PF, teriam sido retirados por Alcantara de um cartão de vacinação de uma enfermeira que teria sido vacinada na cidade de Cabeceiras (GO).

AILTON BARROS CONSEGUE INSERIR DADOS NO SISTEMA

Houve, porém, dificuldade para inserir os dados no sistema do Ministério da Saúde. Cid procurou então o major reformado Ailton Barros, que, segundo a polícia, intermediou a inserção dos dados com a emissão de nova carteira de vacinação pela prefeitura de Duque de Caxias (RJ).

Segundo a PF, Gabriela viajou para o exterior em três ocasiões depois do esquema, burlando a exigência de vacinação.

Em acordo de colaboração, Mauro Cid afirmou que, depois que obteve o cartão da esposa, pediu para Barros intermediar outros certificados falsos de vacinação ?para o próprio Cid e suas filhas. A inserção dos dados falsos, segundo a PF, foi realizada por João Carlos Brecha, secretário do município de Caxias.

CID ENTÃO PEDE FALSIFICAÇÃO DO CARTÃO DE BOLSONARO

Em colaboração premiada, Cid afirmou que pediu a Ailton Barros cartões de vacinação falsos para Bolsonaro e sua filha, Laura, assim como a inserção dos dados no ConecteSUS.

O ex-ajudante de ordens disse que a determinação veio do próprio ex-presidente, depois que ficou sabendo que Cid havia conseguido o documento para a família. Em depoimento, Bolsonaro negou ter dado essa ordem.

Segundo a PF, o modus operandi do esquema funcionava assim: primeiro, alguém pedia a Cid que conseguisse um certificado de vacina falso. Ele, então, encaminhava o pedido a Barros que, por sua vez, enviava os dados do beneficiário ao secretário de Duque de Caxias, João Carlos Brecha. Brecha, por ter credenciais de acesso, inseria os dados falsos no sistema do Ministério da Saúde.

De acordo com a polícia, foi ele o operador que inseriu no sistema, no dia 21 de dezembro de 2022, a informação de que Bolsonaro teria tomado duas doses da Pfizer no Centro Municipal de Saúde de Duque de Caxias. Brecha também teria inserido dados falsos sobre a vacinação de Laura, filha do ex-presidente.

Na inserção realizada em dezembro, Brecha informou que Bolsonaro tomou a primeira e a segunda doses em agosto e outubro de 2022, respectivamente. Geralmente os dados da vacinação são inseridos imediatamente no sistema do Ministério da Saúde.

A CGU (Controladoria-Geral da União) identificou que o ex-presidente não esteve em Duque de Caxias na data da suposta imunização com a primeira dose. Ele passou o dia na cidade do Rio de Janeiro, participando da Marcha para Jesus.

CID EMITE CERTIFICADO DE BOLSONARO

Segundo a PF, no dia seguinte à inserção dos falsos dados de imunização no sistema do Ministério da Saúde, Cid chegou ao Palácio da Alvorada, acessou o ConecteSUS do então presidente e emitiu o certificado de vacinação. Em sua casa, João Carlos Brecha cadastrou um email para se conectar à conta de Laura no ConecteSUS e emitiu o certificado da filha de Bolsonaro.

A PF argumenta que o ex-presidente não apenas tinha ciência, como ordenou a falsificação.

"Vários atos de acesso ao sistema ConecteSUS, inclusive a impressão de certificado de vacinação ideologicamente falso, foram praticados na residência oficial da Presidência da República, Palácio do Alvorada, ocupada na época dos fatos por JAIR MESSIAS BOLSONARO", diz relatório da PF.

Em depoimento em maio do ano passado, Bolsonaro negou ter solicitado a Cid ou a outras pessoas envolvidas no esquema a adulteração dos cartões de vacina dele e de sua filha, e disse desconhecer motivos para que tenham feito isso.

Ele afirmou ainda não acreditar que seu ex-ajudante tenha arquitetado a ação criminosa, que não a determinou, e que se ele o fez, "foi à revelia, sem qualquer conhecimento ou orientação" dele.

Bolsonaro também disse que só teve conhecimento da adulteração quando esse tema começou a ser divulgado pela imprensa, em fevereiro de 2023. Ele afirmou ainda que nem sequer sabia mexer no ConecteSUS e que toda a sua "gestão pessoal" sempre ficou a cargo de Cid. Mas disse não saber se foi, de fato, o ex-ajudante quem emitiu os certificados.


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