SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - A ministra do STF (Supremo Tribunal Federal), Cármen Lúcia, afirmou nesta segunda-feira (8) que o Judiciário ainda é conservador, machista e sexista.
"É preciso que a gente, cada vez mais, tenha ciência e sensibilidade para saber que nós temos mulheres de notável saber jurídico, com reputação elevada, e que querem, podem e devem contribuir para uma perspectiva verdadeiramente democrática e igualitária no Judiciário e no Supremo Tribunal Federal", afirmou a ministra ao receber a homenagem do ano do Prêmio Todas 2 Folha/Alandar.
Na celebração, ela foi lembrada que atualmente é a única mulher no STF e, em toda a história do Brasil republicano, está entre as três representantes femininas. Além de Cármen Lúcia, também integraram a corte as ministras Ellen Gracie e Rosa Weber, já aposentadas.
Apesar de celebrar uma reunião composta majoritariamente por mulheres, com "imprensa livre e empresas comprometidas", a ministra ressaltou as injustiças contra mulheres e a escalada de feminicídios.
"No dia da Justiça, as injustiças contra mulheres no Brasil atingiram patamares que não é só de contrariedade ao direito, é de desumanidade, falta de civilidade, de indignidade", disse a ministra.
"Nós precisamos tomar algumas atitudes, como sociedade, para que dê um basta nesta matança de mulheres. Não é mais possível que a gente continue assistindo mulheres sendo assassinadas, violentadas", disse.
"Neste ano, são quase 700 crianças órfãs e muitas delas viram seus pais, seus padrastos, companheiros das suas mães, mutilarem ou matarem na frente delas. Isto é, como eu disse, a negação da civilização. Isto é ato de barbárie".
Em discurso em que tentava ser positiva pelo reconhecimento do trabalho das mulheres, a ministra elencou ainda outras injustiças na representação feminina. Ela lembrou que as cotas foram criadas nos anos 1960 para minorias, mas as mulheres, que são 52% do eleitorado brasileiro, ainda são pouco representadas no Congresso.
"Nós temos a pior representação no Congresso Nacional em termos de números. Em termos de quantidade, nós somos uma das piores representações nas Américas", disse a ministra. Ela parafraseou o poeta Carlos Drummond de Andrade em comentário sobre o caso de Ângela Diniz. "Aquela moça continua sendo assassinada todo dia e de diferentes maneiras".
Carmén Lúcia falou ainda sobre a subrepresentação na tecnologia, tema do Prêmio Todas 2 deste ano, uma parceira da Folha de S.Paulo com a consultoria Alandar. "Acabamos de fazer uma das fases de auditagem das urnas eletrônicas e, das quase 140 propostas que apresentaram nesse ano, tinham apenas 13 mulheres", disse.
Presidente do TSE (Tribunal Superior Eleitoral) no biênio 2024-2026, a ministra ressaltou a necessidade da imprensa livre durante as eleições do próximo ano e lamentou as fraudes nas cotas de gênero. Na homenagem, ela foi reconhecida por sua trajetória pública marcada pela defesa da democracia, igualdade e cidadania. "É preciso que nós continuemos juntas e, se há muitas lágrimas e muitas feridas a curar, é urgente que a gente faça isso juntas", disse.