Levantamento divulgado pela Associação Brasileira para o Estudo da Obesidade e da Síndrome Metabólica (Abeso) e pela Sociedade Brasileira de Metabologia e Endocrinologia (SBEM) realizado em fevereiro de 2022, por meio de aplicação de formulário eletrônico, aponta que, em um universo de 3.621 pessoas, com idades entre 18 e 82 anos, 85,3% dos participantes já sofreram constrangimento por conta do peso. Conforme a pesquisa, quanto mais alto o grau de obesidade, proporcionalmente maior é a intimidação.

Os lugares em que as pessoas apontam ter sofrido maior constrangimento são: dentro de casa, causado por familiares (72%), estabelecimentos comerciais (65,5%), entre amigos (63%), em consulta médica (60,4%) e no ambiente de trabalho (54,7%). Outro dado que chama a atenção no levantamento é o número de pessoas que afirmaram ter tentado previamente adotar práticas para perda de peso (93,6%).

A conclusão a que chegaram a Abeso e a SBEM é a de que o cuidado dispensado às pessoas acima do peso precisa ser revisto, tanto no sistema de saúde público, quanto no privado. O acolhimento a essa população é fundamental no resultado do tratamento. As entidades reforçam que a obesidade precisa ser combatida, não as pessoas com obesidade. “E sim tratar a doença e respeitar quem convive com ela, acolhendo, ouvindo, estudando, andando junto”, afirma o texto de abertura da iniciativa. Mais que um plano, o estudo aponta que é necessário partir para promover efetivamente a saúde.

Nos consultórios, o que se verifica, é que o período da pandemia foi algo que impactou a população, nesse sentido. Muitas pessoas ganharam peso no tempo que passaram em casa, com a interrupção da prática de exercícios físicos e por conta da diminuição dos deslocamentos.

“Os pacientes relatam a piora do padrão alimentar, enquanto estavam reclusos em casa. Há também outros fatores, como o aumento da ansiedade, a dificuldade de ir até o mercado, para comprar alimentos mais saudáveis. Usaram mais alimentações que podem ser solicitadas via aplicativo, optado por coisas mais calóricas”, conta a médica endocrinologista e metabologista, Thaís Faria Tannure, que é professora do curso de Medicina da Faculdade De Ciências Médicas de Três Rios (SUPREMA).

Thaís também considera que os pacientes que tinham algum histórico de depressão, ou ansiedade anterior à pandemia, sentiram os sintomas se agravarem por inúmeros fatores, como o isolamento, o luto por familiares que morreram em função da Covid-19, a perda de emprego e o aumento do custo de vida, entre outros.

“Isso tudo teve muita correlação com o alimento, porque nós costumamos usar o alimento como uma forma compensatória, o que contribuiu para o ganho de peso”, diz a médica. Um outro ponto que precisa ser contabilizado é a descompensação de doenças crônicas. “Pacientes que já eram diabéticos, tanto aqueles que usavam insulina, quanto os que não usavam, ficaram muito tempo sem vir para consulta ambulatorial. Isso acentuou o quadro de descompensação. Doenças crônicas que eram mais controladas, apresentaram piora significativa.”

Pacientes que tiveram a síndrome pós-covid, com queixas de esquecimento, fraqueza muscular, indisposição, entre outros sintomas também têm comparecido com maior frequência nos consultórios. “Algumas pessoas que foram infectadas pela Covid lá no início, que tiveram uma versão mais grave da doença, tiveram uma diminuição da capacidade pulmonar também. Começaram a ficar com menor tolerância aos esforços. São coisas que conseguimos observar na nossa rotina”, comenta Thaís.

Atendimento Multiprofissional para uma atenção completa

Para conseguir atender o paciente dentro de suas necessidades, com uma abordagem que seja mais adequada à situação dele, é necessário, segundo a médica Thaís Faria Tannure, oferecer uma atenção ampla, com a participação de profissionais de áreas diferentes. “A Medicina tem mudado, quando a gente oferece um efetivo tratamento, temos que fazer isso pensando no indivíduo como um todo. Cada especialidade, cada profissão tem uma contribuição importante dentro da sua área. Se cada um olhar isso de maneira individual e reunir as avaliações, buscando pensar o todo, o paciente só sai ganhando, porque ele consegue ter o melhor de cada profissional.“

Thaís salienta ainda que esse processo é difícil para a maioria dos pacientes, porque a construção de novos hábitos é desafiadora. “Nossa cabeça é programada para sempre fazer as mesmas coisas, porque aquilo ali a gente já conhece, é mais confortável. Quando tentamos junto com os pacientes instaurar novos hábitos, é complicado a gente estruturar novamente. Tanto que vamos tentando fazer isso aos poucos, tentando avaliar o que é possível.” O primeiro passo, para ela, envolve entender que o cuidado com a própria saúde precisa ser uma prioridade. Já que o esforço maior de hoje, poderá trazer um benefício no longo prazo.

Por isso, conforme a médica endocrinologista e metabologista, é fundamental que os pacientes não tenham vergonha de falar sobre suas dúvidas e dificuldades. “Não tem que achar que vai ser julgado por não conseguir estabelecer algo que tinha sido combinado. Estamos aqui para ajudar, guiar, orientar e ouvir, entender as dificuldades, buscar outras formas de abordagem. É o que eu sempre digo, seja o mais sincero possível comigo, com a nutricionista, com todo mundo que trabalha aqui, para a gente entender a realidade e para que a gente consiga ajudar o paciente, para que ele entenda que não está sozinho, estamos aqui para lutar pelo mesmo objetivo.”

 

Pixabay - Acolhimento é chave para superar os estigmas pelos quais passam a população obesa

COMENTÁRIOS: