Juliano Nery Juliano Nery 17/6/2011

Até quant(d)o

 

Compras coletivasE não é que até recebi com simpatia esta história de compras em grupo? Cheguei até a comprar uns cupons. Cupons até de coisas que não imaginava nunca comprar. Até voo de asa-delta em Boituva, que nem sei onde fica; máscara de argila; cem mini coxinhas com até 50% off! Eu deveria até ter me controlado, mas o consumismo, aliado aos descontos na compra, venceram-me facilmente. Até aí, tudo bem. Até começarem os problemas: como ir até Boituva para praticar ao bendito voo? Como marcar horário na esteticista, se ela atende até um determinado número de cupons por dia? Como comer tanta coxinha até vencer o prazo de validade? Até resolveram a questão da compra por preços módicos, mas a questão do consumo coletivo, vamos ter que esperar até segunda ordem...

Tenho até observado coisas inusitadas em restaurantes e lanchonetes, como uma certa separação, a partir das compras coletivas: a legião dos cupons versus a legião dos que não aderiram ao novo modelo comercial, até segunda ordem, vale dizer. Segregação muitas vezes iniciada pelo gerente do estabelecimento, que olha com aquela cara de "ih, lá vem mais um com cupom" e que passa até pelo garçom que vai atender à mesa. Corrente que não vai acabar até que outro consumidor, aquele que não optou pela aquisição do ticket com desconto, se manifeste: "como ele foi atendido antes de mim, se está até pagando com cupom?"

Como não quero ser refém de ninguém, até porque ninguém pagaria o meu resgate, pretendo ficar atento não somente aos percentuais de descontos, mas às formas de usufruir o serviço. Talvez parar até para pensar melhor quando aquele restaurante árabe que custa os olhos da cara me oferecer a oportunidade de comer um delicioso buffet por preço irrisório. Vai ver até que o tal buffet não seja composto por mais do que duas esfirras de carne moída e um kibezinho mequetrefe. E não dá nem para se aventurar a complementar o pedido, até porque o cardápio verdadeiro não tem desconto. É até triste pensar como pode ser a vida.

É legal ver a possibilidade de turismo, gastronomia, bares, estética, aventura e até esporte tão próximo de nossas mãos. Dá vontade de ter até três mãos e 25 fontes pagadoras de salário por mês para poder manusear e deliciar tantas possibilidades previstas por esses clubes urbanos. O que compromete é o fato de ter que ficar esperando até um mês para conseguir uma reserva ou a supracitada má vontade em atender aos "clientes de cupom", que estão se tornando cada vez mais representativos no comércio. É bom até que esse panorama se modifique, já que o comprador de cupom vem se tornando cada vez mais importante. Principalmente nas baixas temporadas e/ou em dias de baixa procura durante a semana, que fazem qualquer comerciante arrancar os cabelos e fazem até aparecerem rugas. Louvados sejam os compradores em massa, que tornam real até a possibilidade de movimentar o faturamento.

Os clubes de desconto estão em todos os lugares e até mesmo no coração da sociedade. Todo mundo quer oferta, mas até nos preços mais baixos, a qualidade dos serviços e produtos deve ser o imperativo. Ficarei de olho até a próxima oferta pintar no meu email, o que não deve levar nem 15 minutos. Mas procurarei utilizar lentes mais exigentes, para não me seduzir ante a visão do preço atrativo e deixar itens importantes, como até a qualidade de lado. Até quant(d)o for possível...

Juliano Nery escreveu ‘até’ em todas as frases do artigo desta semana. Até semana que vem, pessoal.

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Juliano Nery é jornalista, professor universitário e escritor. Graduado em Comunicação Social e mestre na linha de pesquisa Sujeitos Sociais, é orgulhoso por ser pai do Gabriel e costuma colocar amor em tudo o que faz.