Xerox de obras liter?rias

Marco Aur?lio Nogueira

ACESSA.com - Muitas vezes, os alunos fazem c?pias de livros inteiros ou parte de um livro em vez de comprar. Isso para evitar ou n?o poder fazer gastos excessivos (os livros nem sempre possuem um pre?o acess?vel). Como voc? v? a quest?o de alunos fazerem c?pias de livros, tanto no 2? grau quanto no 3? grau, mesmo sendo proibido? Qual sua vis?o sobre este fato?

Marco Aur?lio Nogueira - Numa era de reprodutibilidade t?cnica turbinada (isto ?, em que tudo pode ser facilmente reproduzido), parece-me perda de tempo brigar com as c?pias de livro. ? mais sensato tentar encontrar um ponto de equil?brio. Os autores poderiam abrir m?o de direitos autorais e os editores diminu?rem seus lucros, por exemplo. Nada a ver com "propriedade intelectual", que deve continuar a ser respeitada plenamente. Mas o "dono" de uma id?ia n?o precisa necessariamente ganhar dinheiro com ela, e mesmo que queira fazer isso n?o precisa faz?-lo mediante livros.

Outra coisa ? mudar a mentalidade dos professores. Para aprender, n?o ? necess?rio que se leiam dezenas de peda?os de textos. Antes se usavam manuais, que n?o fazem qualquer sentido hoje em dia e sempre foram uma p?ssima op??o. ? perfeitamente poss?vel organizar um excelente curso baseado na leitura obrigat?ria de 2 ou 3 livros, um curso que se apoiei nesses livros e no conhecimento mais abrangente do professor. Mas isso requer professores dispostos a trabalhar mais, a usar mais a imagina??o, a ter maior seguran?a argumentativa, etc., coisa que n?o ? f?cil de encontrar numa escola como a de hoje, que est? em crise.

? verdade que os livros nem sempre possuem um pre?o acess?vel. Mas muitas vezes encontramos edi?es a bons pre?os. ? uma quest?o de h?bito e de atribui??o de valor. Por que ? que se compraria um livro de 25 reais para um curso em que haja pouca din?mica intelectual, ou pouco empenho pedag?gico, se com essa quantia eu posso comprar v?rias outras coisas? No caso de car?ncias extremas (em que a op??o fica entre comprar um livro ou comprar comida, por exemplo), d? pr? entender.

Mas em outros casos, a ?nica conclus?o ? que se trata de maus h?bitos intelectuais. Estudar a s?rio, adquirir uma boa e s?lida forma??o, n?o ? algo poss?vel sem investimentos efetivos e sistem?ticos -- e despesas financeiras com livros precisam ser inclu?das nesses investimentos. Fora da?, mergulhamos num mundo excessivamente rom?ntico ou paternalista.

ACESSA.com - Como isso acontece h? anos, e as pr?prias universidades possuem diversos pontos de xerox em seus campus, voc? pensa ser poss?vel acabar ou, pelo menos, diminuir este tipo de crime, que, algumas vezes, os alunos nem sabem que est?o cometendo?

Marco Aur?lio Nogueira - Primeiro, acho que se deveria "descriminalizar" isso, pelos motivos a que me referi acima. Vai-se fazer o qu?? Prender o aluno, o professor ou o dono da xerox? Exigir repara?es por perdas e danos? A quest?o ? de crit?rios. A reprodu??o de textos ? uma ferramenta de trabalho e deveria ser encarada assim. Livros podem ser fetiches, mas c?pias xerox n?o. As universidade e os professores deveriam incentivar pr?ticas intelectuais alternativas, nas quais os livros (inteiros) tivessem lugar de destaque. A din?mica atual, por?m, ? quantitativista: vale mais aquele que controla mais informa?es, que l? mais migalhas de livros, que se refere a maior n?mero de autores, etc. De repente, o professor acha que, para ser bem avaliado por seus pares e por seus estudantes, ele precisa organizar cursos com dezenas de p?ginas picadas de leitura.

Os pr?prios estudantes deveriam fazer algo nessa dire??o. Por exemplo: se o livro ? caro (coisa que nem sempre ?), que se comprem livros em grupo, de modo a compartilhar o custo. Usado o livro, ele pode ser emprestado ou revendido para o colega que far? o curso no ano seguinte. Os "sebos" existem tamb?m para isso, n?o apenas para p?r rel?quias ? venda.

ACESSA.com - A reclama??o dos estudantes ? que nem sempre conseguem encontrar uma bibliografia dispon?vel na Biblioteca. Ou, se existe, a quantidade de livros n?o ? suficiente para atender a demanda. O que voc? pensa sobre isso?

Marco Aur?lio Nogueira - As bibliotecas deveriam ser o cora??o das escolas e particularmente das universidades. Deveriam ter a bibliografia dos cursos, com certeza, e com um n?mero de exemplares compat?vel com o n?mero de alunos. Para isso, por?m, teriam de dispor de uma verba gigantesca, e hoje, al?m de livros, as escolas demandam computadores, espa?os, equipamentos, bons sal?rios para professores e funcion?rios, subs?dios para moradia e alimenta??o, e mil outras coisas.

Como compatibilizar? Algo sempre pode ser feito, e ? a? que entra a criatividade dos bibliotec?rios, dos diretores e reitores, dos professores e dos estudantes, das editoras e dos livreiros. N?o h? f?rmula m?gica. No fundo, as pessoas deveriam parar de pedir tudo, e de querer tudo ao mesmo tempo, e partir para um planejamento mais criterioso das solu?es. Confundir indigna??o, cr?tica e agita??o com paralisia propositiva ? p?ssimo, pois nos empurra para tr?s.

ACESSA.com - O que voc? pensa sobre a "pasta do professor" (pasta com livros e textos que o professor disponibiliza na ?rea de xerox da faculdade)? Sua exist?ncia deveria ser proibida ou ? um "mal necess?rio"?

Marco Aur?lio Nogueira - A id?ia das "pastas" ? muito pouco eficiente. D? a ilus?o de que se est? resolvendo um problema, mas na verdade s? acaba por prolong?-lo. Instrumentaliza a leitura, e dificulta a rela??o de prazer entre leitor e texto. O xerox ? feio, suja as m?os, ? dif?cil de ser guardado e ? mais perec?vel que um livro. Didaticamente, pode at? ter um sentido, mas ? algo imediatista. Se vier a ser inevit?vel (podem existir cursos que necessitem de dezenas de textos), que a pasta seja implementada com algum crit?rio. Por exemplo: ponham-se na pasta apenas artigos de revistas, jamais peda?os de livros. Um livro est? esgotado, ? raro e imposs?vel de ser comprado? Ent?o, que se fa?am logo dez c?pias dele e se ponha tudo na biblioteca. Paralelamente, que se incentivem os alunos a comprar livros.

Um estudante universit?rio que n?o se preocupe em formar a sua biblioteca pessoal est? num caminho equivocado. Um professor que d? cursos em cima de "textos" e n?o de livros, que privilegia o fragmento ilustrativo em vez das grandes id?ias ilustradas, ? algu?m que precisa receber uma forma??o adicional. O mundo eletr?nico tamb?m nos oferece algumas op?es. Muitos autores disponibilizam seus artigos ou mesmo cap?tulos de seus livros na Internet. Muitas revistas acad?micas t?m tamb?m uma vers?o digitalizada, f?cil de ser acessada. Podem ser organizados grupos de discuss?o entre alunos e professores, nos quais alguns artigos s?o franqueados aos participantes.

Alguns textos podem ser lidos na tela do computador, nem precisam ser xerocados. S?o poucos os que t?m acesso a computadores e redes, ? verdade, mas a tend?ncia ? de expans?o -- de maior "inclus?o digital", como se fala -- e dever?amos desde j? come?ar a nos preparar para isso.

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