A face vis?vel do ?xodo

Ailton Alves Ailton Alves 07/01/2008

Foto de Raphael Botti O campo ? no outro lado do mundo, mas a bola ? a mesma e est? com o camisa dez do time, que levanta a cabe?a e tabela com um companheiro. Recebe de volta, enfileira os zagueiros, dribla o goleiro e toca para as redes - que s?o as mesmas.

O est?dio continua localizado bem longe, l? onde o sol mundial se p?e. A pelota ? a mesma, redonda, e est? parada, escrava, esperando as ordens do craque da equipe. O chute vem, certeiro, passa pela barreira e entra bem rente ? jun??o das traves - que s?o as mesmas.

Os zagueiros perplexos diante da evolu??o do craque s?o sul-coreanos. O goleiro que ficou no ch?o, tamb?m. J? o outro arqueiro, sem a??o na cobran?a de falta, ? japon?s. S? o algoz, o protagonista principal das duas jogadas, ? o mesmo: Botti.

Raphael Botti ?, para mim, a face vis?vel do ?xodo dos jogadores brasileiros. N?o adianta a CBF soltar boletins informando que s?o tantos os atletas que jogam no exterior e que ? de xis por cento a evolu??o, ano a ano, dessa debandada de talentos. Isso ? papel, estat?stica, burocracia. Para saber a dimens?o do fen?meno ? preciso ver - e ?s vezes n?o crer. ? dif?cil acreditar que esse menino de 26 anos, em f?rias no Brasil, em Juiz de Fora, ? o mesmo que ? venerado na Cor?ia do Sul - onde jogou por cinco anos, no Jeonbuk Hyunday -, e caminha para ter o mesmo destino no Jap?o - onde atua, desde mar?o, no Vissel Kobe.

Por aqui, por ora, ? ainda o garoto nascido e criado nas imedia?es dos bairros Bom Pastor e Alto dos Passos, e n?o o craque consagrado, que quase se naturalizou coreano, para jogar a Copa e foi eleito o melhor estrangeiro do primeiro turno do campeonato japon?s - mesmo jogando recuado, quase como um segundo volante. "O treinador me pediu. Est? dando certo, mas me tira a alegria de fazer muitos gols, como acontecia na Cor?ia".

Botti tem saudades da fam?lia, do quiabo, do Brasil e do modo de vida do brasileiro. Por?m, em pouco tempo de conversa, desmonta a vis?o, t?o rom?ntica quanto falsa, de que vive uma esp?cie de ex?lio imposto pela bola. N?o. Ele deixou S?o Janu?rio, trocou a Cor?ia pela cidade japonesa conhecida pelo terremoto, e pode, mais adiante, ir jogar na Europa, tudo por livre e espont?nea vontade.

Foto de Raphael Botti Se fosse isso, um ex?lio, ficar?amos, os torcedores, como na can??o de Tom & Chico, ? espera de que ele volte, "para ouvir o canto do sabi?" (que, para falar a verdade, nem sei se existe mais). Mas, ele vai voltar? "Daqui a tr?s anos, talvez." E para o Vasco? "Seria bom. Quem sabe?".

Uma pena, essa n?o-certeza, porque para n?s, vasca?nos, Botti ? uma das faces invis?veis, e explica??o l?gica, da decad?ncia do nosso time. Ele viveu dentro de S?o Janu?rio desde os 13 anos de idade, mas s? jogou pelo time profissional uma temporada, a de 2001. Desde que ele partiu - e tamb?m outros de sua gera??o - s? ganhamos um m?sero campeonato, o Carioca de 2003. Deixamos, sem cerim?nia e resignados com o castigo, que os nossos levantem ta?as para outras torcidas, em outros cantos do mundo - Botti ganhou, entre v?rias, a Liga dos Campe?es da ?sia, em 2006, t?tulo que o levou a disputar, pelo Jeonbuk Hyunday, o Campeonato Mundial da Fifa, contra o Barcelona de Ronaldinho Ga?cho e Deco e o Internacional de Fernand?o e Alexandre Pato.

Quando voltar, cumprido seu per?odo migrat?rio, Botti, t?o acostumado com o profissionalismo e o respeito que tem l? fora, talvez nem queira mais se aventurar na bagun?a do futebol oficial brasileiro. Seu caminho pode ser outro. "Quero trabalhar com os jovens. Dar ao garoto bom de bola a oportunidade de mostrar sua arte nos gramados. Quero retribuir ao futebol o muito que ele me deu" - Eis a outra face, igualmente vis?vel, do craque.



Ailton Alves ? jornalista e cronista esportivo
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