Cerimônias de adeus
No futebol, as cerimônias de adeus são diferentes. Depende do personagem e do país onde se comete o ato. Quando abandonou o Santos, Pelé se ajoelhou no centro do gramado e abriu os braços, como se fosse um Cristo pronto a ser crucificado (no caso, por não disputar a Copa de 1974 e principalmente porque se recusou a ser eterno). Três anos depois, quando encerrou sua aventura no Cosmos de Nova York disse apenas: “Love, love, love” (no caso, virando música do Caetano e causando muita polêmica – igual a quando dedicou seu milésimo gol às crianças do Brasil).
Cito Pelé, suas despedidas e polêmicas porque ontem Juninho, o pernambucano, também disse adeus, ao Lyon da França. Em grande estilo, como é de seu feitio. Estava no banco de reservas (!?), entrou na metade do segundo tempo e quando faltavam três minutos para o término da partida sofreu a falta, ajeitou a bola e chutou forte, com efeito, cuidando para que a pelota batesse no chão, enganasse o goleiro e estufasse as redes. Depois, tirou a camisa e foi saudar a torcida, que o adora.
Bem diferente de sua despedida anterior, do Vasco da Gama. Final do campeonato brasileiro de 2000, em janeiro do ano seguinte. Após uma tabela envolvente, Juninho teve a bola à feição, na entrada da área, e colocou a pelota no ângulo, longe do alcance do goleiro do São Caetano. Não foi, no entanto, à torcida vascaína (que o adora – tanto que o eternizou na música, que dá conta de outro gol, cantada hoje em dia em São Januário). Ficou imóvel no gramado, só pronto para os abraços dos companheiros.
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No futebol, os dirigentes são iguais, não importa se mandam aqui ou na Europa. Juninho, o pernambucano, sofreu na pele todos os dissabores provocados pelos cartolas. No Brasil, há oito anos, ele não comemorou o gol que ajudou o Vasco a ser tetracampeão brasileiro por estar em guerra aberta com Eurico Miranda. Na França, ontem, ele estava no banco de reservas por imposição do presidente do clube – que o acha velho demais para o time.
No Vasco, Juninho foi vítima da truculência; no Lyon, está sendo um símbolo da mais cruel das ingratidões.
Quando chegou à França, o Lyon não era nada, nunca tinha sido campeão francês. Com Juninho, o clube levantou por sete vezes seguidas (2002/03/04/05/06/07/08) a taça. Guardadas todas as possíveis proporções (com Pelé, principalmente com Pelé) nunca houve na história do futebol mundial alguém que representasse tão bem uma hegemonia, um monopólio de títulos, um período tão grande de glórias.
Só que, agora, o presidente do clube acha que Juninho fará um favor se partir.
Pode parecer um caso isolado, mas não é (vide os apuros de Ibrahimovic e Seedorf em Milão, respectivamente na Inter e no Milan). A Europa não é mais tão civilizada como outrora. Foi-se o tempo em que as cerimônias de adeus eram escritas com a serenidade de uma Simone de Beuavoir.
Ailton Alves é jornalista e cronista esportivo
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