SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - O número de denúncias de trabalho infantil no estado de São Paulo aumentou 130% em dois anos e voltou em 2022 ao patamar pré-pandemia, segundo dados do Ministério Público do Trabalho.

De janeiro a dezembro do último ano, o órgão contabilizou 373 queixas -próximo dos 382 registrados em 2019. Em 2020, primeiro ano da crise sanitária, o número havia despencado para 162.

O Plano Nacional de Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil e Proteção ao Trabalhador Adolescente considera trabalho infantil atividades econômicas ou de sobrevivência realizadas por pessoas em idade inferior a 16 anos, exceto na condição de aprendiz.

Ana Elisa Segatti, procuradora do Trabalho em São Paulo e membro da Coordenadoria Nacional de Combate à Exploração do Trabalho da Criança e do Adolescente, a menor taxa de denúncias no período mais crítico da pandemia está relacionada ao isolamento da população.

"A partir de meados de 2021, a imunização em massa permitiu à população sair de casa novamente e observar os efeitos nefastos da pandemia na vida daqueles menos favorecidos. Por isso, há mais denúncias desde então", explica Segatti.

"Enquanto estávamos, legitimamente, preocupados com a saúde, havia uma epidemia de pobreza e abuso se desenvolvendo. Não estava à vista, por isso a subnotificação. Agora, a tendência é mesmo o crescimento", afirma a procuradora.

Em 2020, a OIT (Organização Internacional do Trabalho) e o Unicef (Fundo das Nações Unidas para a Infância) divulgaram um relatório sobre o tema.

O documento mostrava que o de afetados pelo trabalho infantil no mundo cresceu pela primeira vez em duas décadas. As organizações estimaram que, no início de 2020, 160 milhões de menores foram obrigados a trabalhar, 8,4 milhões a mais que os catalogados em 2016.

O crescimento da parcela de pobres em decorrência da pandemia de Covid-19 foi a principal causa apontada pelo levantamento.

No estado de São Paulo, o novo Plano Estadual de Enfrentamento ao Trabalho Infantil, ainda não publicado no Diário Oficial, estabelece, dentre outros pontos, o CadÚnico (Cadastro Único Para Programas Sociais) como centralizador na identificação de crianças em situação irregular de trabalho.

O material, que deve vigorar entre 2023 e 2026, também cita o ensino público em tempo integral como importante na retirada dos menores das áreas em que são explorados.

Reportagem desta Folha de S.Paulo mostrou que, para especialistas, apesar de necessária, a pressa na implementação de escolas em tempo integral no estado de São Paulo não levou em conta os cuidados necessários para evitar prejuízos e a exclusão de estudantes vulneráveis.

Gilberto Nascimento, secretário estadual do desenvolvimento social, diz que a execução do plano de enfrentamento é uma das metas da gestão Tarcísio de Freitas (Republicanos).

"Vamos trabalhar em todo o estado, por meio das secretarias municipais de assistência social, para conscientizar e engajar a sociedade civil nessa mobilização cidadã", afirma.

"Além disso, vamos cadastrar, acompanhar e atender as famílias em situação de trabalho infantil e incluí-las, prioritariamente, nos serviços de convivência e fortalecimento de vínculos, nos programas de transferência de renda, no programa VivaLeite, entre outros", acrescenta Nascimento.

Danilo Moura, oficial de monitoramento e avaliação do Unicef, diz que a alta nas denúncias em São Paulo não é surpresa e exige ser combatida em várias frentes.

"O trabalho infantil é um fenômeno de muitas causas. Ele ocorre com frequência quando a família enfrenta pobreza, fome e desemprego. Indicadores nacionais nos mostram exatamente esse cenário", diz ele.

O especialista acrescenta que políticas públicas de enfrentamento ao trabalho infantil foram enfraquecidas durante o governo de Jair Bolsonaro (PL).

"Temos um cenário de desproteção social. Os mecanismos de combate foram minuciosamente desconstruídos nos últimos anos. Em meio à pandemia, o orçamento do Peti [Programa de Erradicação do Trabalho Infantil] diminuiu muito. Foi uma tempestade perfeita", declara o oficial da Unicef.

O Peti teve início em 1996 para combater o trabalho de crianças em carvoarias da região de Três Lagoas, e em Mato Grosso do Sul. Com investimento estatal, sua cobertura foi, em seguida, ampliada para alcançar progressivamente todo o país.

Em 2005, o programa foi integrado ao Bolsa Família. Segundo o porta-voz, com as mudanças provocadas na política social pelo governo Bolsonaro, incluindo a mudança de nome, o Peti foi escanteado.

"Devemos priorizar a reestruturação das políticas de transferência de renda, como parece acontecer agora com o Bolsa família que traz acréscimo para crianças de até 6 anos. Junto a isso, os estados devem trabalhar para planejar o futuro desses jovens. Escola, profissionalização, pleno emprego, tudo deve ser visto", completa Moura.


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