SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Privatizado há cerca de um ano e meio, o Mercado Municipal de São Paulo completa 90 anos nesta quarta-feira (25) compartilhando algumas das aspirações e dificuldades da cidade da qual é um dos símbolos.

Se por um lado o edifício e seus mais de 13 mil metros quadrados se valem de grandiosidade, diversidade, aromas e sabores para atrair turistas domésticos e estrangeiros, por outro está mergulhado na degradação que consome a região central da também aniversariante capital paulista, que chega aos 469 anos.

Nos planos da Mercado SP SPE S.A., empresa de capital fechado mantida por um fundo de investidores que ofertou mais de R$ 100 milhões pelo direito de explorar comercialmente o espaço por 25 anos, está na hora de tornar o Mercadão a "maior experiência gastronômica do mundo", diz o seu diretor-presidente Aldo Bonametti. "Estamos transformando em uma empresa de classe mundial", diz.

Para o administrador, a atração paulistana reúne condições para figurar entre os "Sete Magníficos", nome da iniciativa criada pelo Mercado Municipal de Londres para dar mais projeção a esses negócios no mundo, entre as quais estão a La Boqueria, de Barcelona, e o Mercado Central de Budapeste. "O nosso, que é o mais magnífico, não está nessa lista", diz.

Advogado, Bonametti, 55, afirma conhecer bem o potencial do mercado com o qual convive há mais de 20 anos. Ele é conhecido por advogar para clientes do entorno, entre eles Law Kin Chong, empresário chinês naturalizado brasileiro investigado pela CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) da Pirataria e que já foi considerado um dos principais contrabandistas do país. Chong não está entre os investidores da Mercado SP, afirma Bonametti.

Após a redução das restrições de circulação provocadas pela pandemia, o Mercadão teve no final do ano passado um dos períodos de maior movimento dos últimos anos. Cerca 20 mil pessoas circularam por dia no local aos finais de semana. De segunda a sexta-feira, o movimento cai pela metade.

Para atingir a meta de recuperar o valor investido antes do meio do prazo da concessão, além de pagar a conta dos cerca de R$ 80 milhões aplicados no restauro do prédio -previsto para ser concluído até o fim deste ano-, a concessionária espera contar com bem mais do que o público que já voltou a lotar os corredores do prédio projetado pelo escritório do engenheiro e arquiteto Ramos de Azevedo.

Criar uma marca própria e oferecer experiências itinerantes, por meio de estandes que levarão o Mercadão de São Paulo para outras partes do país e do mundo, estão entre as apostas do negócio.

Atrair restaurantes badalados também é parte da estratégia. Para isso, haverá ampliação do mezanino inaugurado em 2006, pouco tempo depois da última grande restauração do prédio, em 2004.

Mas uma parte fundamental do projeto está do lado de fora e não depende da empresa: a retirada da feira irregular que há cerca de 30 anos toma os arredores durante a madrugada. A concessionária vem cobrando melhorias do entorno, sobretudo quanto à limpeza e segurança, para que o estabelecimento passe a receber turistas 24 horas por dia.

"Para trazer restaurantes com os quais estamos conversando, é fundamental que eles possam abrir à noite. Sem isso, o custo da operação não compensa", explica o presidente.

A sujeira é a principal reclamação entre comerciantes que convivem com infestações de ratos e baratas em períodos chuvosos. Pragas entram quando o lixo entope galerias e provoca alagamentos no subterrâneo do prédio, contou uma comerciante cuja família está no local desde a inauguração em 1933. Ela pediu para não ter o nome divulgado na reportagem.

A solução depende da transferência da feira, segundo Bonametti, que diz manter conversas frequentes sobre o tema com a gestão do prefeito Ricardo Nunes (MDB).

Em nota, a Prefeitura de São Paulo informou que "a Secretaria Executiva de Segurança Alimentar e Nutricional, Abastecimento e Agricultura e a Subprefeitura Sé trabalham em conjunto buscando uma resolução que traga benefícios para os feirantes e aos permissionários do Mercado Municipal."

A administração destacou, porém, que tais "tratativas estão em fase inicial" e que a "permanência e o cadastro dos feirantes serão estabelecidos somente após estudo" e debates.

Ações de zeladoria são, segundo a Prefeitura, realizadas diariamente em três turnos: manhã, tarde e noite, com a utilização de oito caminhões e uma miniescavadeira. Além disso, a administração afirma que três vezes por semana faz operações para recolher grandes objetos e executa limpeza de bueiros.

Referindo-se frequentemente ao Mercadão como uma "joia a ser lapidada", comerciantes dizem contar com as benfeitorias para ampliar a clientela e, assim, compensarem o aumento do aluguel, a ser aplicado ao final da restauração, conforme prevê o contrato de concessão.

Alguns pagam hoje cerca de R$ 30 por metro quadrado, enquanto o preço na região beira os R$ 400. A concessionária afirma, porém, que a intenção é manter as atuais bancas para garantir a diversidade do local e, por isso, discutirá os aumentos caso a caso.

Com a privatização, também houve a extinção da condição de permissionários. Os comerciantes passaram a ser apenas locatários do espaço e, com isso, podem perder mais facilmente o direito de trabalhar no local se descumprirem regras contratuais.

Nada que assuste Marco Antonio Loureiro, 65, proprietário do Bar do Mané, famoso pelo sanduíche recheado com quase 400 gramas de mortadela e preço acima de R$ 40 que os clientes pagavam sem reclamar enquanto a reportagem esteve no local. "Esperamos que o restauro do prédio traga mais clientes para compensar o aumento do aluguel", disse.

Roque Peta, 68, mais conhecido por Roni, a marca de queijos que sua família comercializa no Mercadão desde a fundação, afirma que as primeiras melhorias trouxeram mais segurança. Engenheiro, disse que reparos na instalação elétrica e no telhado diminuíram receios quanto a choques e incêndios. "Chovia dentro do mercado", afirma. "A fiação estava horrível."

Frequentador assíduo do mercado há 40 anos, o aposentado Sergio Luppi, 77, realizava ao lado da família, na última sexta (20), um passeio guiado.

"Eu tirava a gravata, era obrigatório trabalhar usar no meu serviço, e vinha com o pessoal do trabalho às sextas-feiras, para comer o pastel de bacalhau", recorda.

Para Luppi, o Mercado Municipal é mais limpo e organizado hoje do que no passado, apesar da sujeira no entorno, que piorou, diz. "Tirou o pé para fora, é outra realidade."

O Mercadão em números Inauguração: 25 de janeiro de 1933 (construído entre 1924 e 1933) Área construída: 13.222 m² Estilo: neoclássico, com estrutura de concreto armado Projeto: Escritório Técnico Ramos de Azevedo (Escritório Severo Villares, após a morte do titular, em 1928) Vitrais: autoria de Conrado Sorgenicht Filho, com temas da pecuária e agricultura paulista Estabelecimentos (boxes): 249 (total) Bares e restaurantes: 33 Frequentadores: até 20 mil por dia aos finais de semana; 9 mil de segunda a sexta Local: rua da Cantareira com avenida Mercúrio (região central de SP) Horário ao público: das 6h às 18h (bares, restaurantes e boxes) de segunda a sábado, aos domingos, até 16h Funcionamento do atacado: das 18h às 6h


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