BELO HORIZONTE, MG (FOLHAPRESS) - A fisiculturista Ellen Otoni, 37, está internada em um hospital de Belo Horizonte desde 23 de fevereiro deste ano. Passou por cirurgia para retirada de uma bala de arma de fogo da mandíbula. Usa um aparelho para não perder os dentes, abalados pelo disparo.

Ela foi internada depois de ser atingida por sete tiros disparados pelo namorado, Weldrin Lopes de Alcântara, 44, que se entregou à Polícia Civil quatro dias depois. A suspeita é de tentativa de feminicídio.

Os médicos, segundo informações da família da fisiculturista, avaliam, ao menos até o momento, não haver necessidade de retirada das outras balas, que não atingiram órgãos ou veias.

No ano passado inteiro, em todo o estado de Minas Gerais, 16 mulheres, em média, sofreram tentativa de feminicídio por mês. Além disso, a média mensal de vítimas de feminicídio foi de 14.

Dados da Polícia Civil mostram que o número de crimes de feminícidio, consumados e tentados, aumentou no estado.

Em 2017, o total foi de 459. A partir daí, entra em queda: passou para 441 em 2018, 378 em 2019, 342 em 2020 e 336 em 2021. No ano passado, houve 364, alta de 8,3%.

Quando analisados somente os casos consumados, também se verifica aumento. E, nesse caso, pelo terceiro ano consecutivo.

Em 2017, houve 150. No ano seguinte, a quantidade subiu para 157 e, em 2019, caiu para 142. No primeiro ano da pandemia, em 2020, voltou a aumentar e atingiu 152. Depois, em 2021, passou para 155 e, no ano passado, chegou a 170, alta de 9,7%.

Os dados são disponibilizados a partir de 2015, mas nos dois primeiros anos não há divisão entre feminicídios consumados e tentados.

A lei enquadra como feminicídio o assassinato cometido com o emprego de violência doméstica, familiar, menosprezo ou discriminação pelo fato de a vítima ser mulher. Na maioria dos casos, os autores são maridos, ex-maridos, companheiros, ex-companheiros, namorados e ex-namorados.

Neste ano, dois dias depois do ataque a fisiculturista Ellen, em 23 de fevereiro, uma mulher de 35 anos foi morta a facadas pelo companheiro em Betim, na Grande Belo Horizonte. O homem confessou o crime e foi preso.

Em 3 de março, uma mulher de 39 anos morreu atropelada por um caminhoneiro em frente à filha no Anel Rodoviário, em Belo Horizonte.

A polícia prendeu o motorista, que era marido da vítima, e investiga o caso como suspeita de feminicídio. O condutor do veículo não prestou socorro e fugiu, sendo capturado três dias depois.

Em 2023, dados ainda parciais mostram que o estado teve 11 feminicídios consumados e 14 tentados em janeiro.

A delegada responsável pela Divisão Especializada de Atendimento à Mulher da Polícia Civil de Minas Gerais, Renata Fagundes Ribeiro, afirma se tratar de um aspecto cultural o fato de, mesmo como dispositivos como a Lei Maria da Penha e a Lei do Feminicídio, ainda haver aumento nos casos de agressão contra mulheres.

"A gente ainda está longe do cenário de que essa violência não vai existir mais. É preciso mudar a cultura patriarcal e machista, que banaliza esse comportamento por parte do homem, e que ocorre, às vezes, a partir das próprias mulheres", argumenta.

A delegada afirma que é preciso ter a consciência de quem é o culpado. "Muitas vezes a gente vê as pessoas julgando a conduta das mulheres vítimas, e não do agressor, que é quem deve ser responsabilizado", aponta. "As mulheres ainda são julgadas pela violência que sofreram."

Escondidas O Consórcio Regional de Promoção da Cidadania Mulheres das Gerais teve em janeiro deste ano 44 abrigadas, contra média mensal de 28 no ano passado.

O consórcio é mantido pelas prefeituras de 12 municípios da Grande Belo Horizonte, que reúnem 24% da população do estado, e atende exclusivamente mulheres consideradas como sob grande risco de serem vítimas de feminicídio.

Todas são mantidas em locais secretos onde não é permitido uso de telefone ou internet, para evitar a possibilidade de serem localizadas.

A superintendente do consórcio, Eliana Piola, afirma que o crescimento no número de atendimentos no início deste ano está relacionado com a propagação de uma cultura de violência no país.

"Há um machismo exacerbado, algo assustador. O porte de arma de fogo hoje também é algo muito comum. Isso tem assustado muito", diz a superintendente. "O ato de violência pode ser cometido sem o uso de arma, mas, quando a mulher sabe que há uma arma em casa, às vezes vai embora com a roupa do corpo."

As mulheres atendidas pelo consórcio podem ficar nos abrigos com filhos de até 17 anos. Todas têm acesso a cursos profissionalizantes. A saída ocorre somente quando há condições de segurança para que isso aconteça.

Redes Sociais - Patrícia Romano, de 48 anos, foi assassinada a facadas pelo marido no bairro Grajaú em Juiz de Fora

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