SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Com quase 32 mil pessoas em situação de rua, a cidade de São Paulo reúne 588.978 imóveis vazios, entre apartamentos e casas, conforme dados do Censo 2022 publicado pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas) na última quarta-feira (28).
A discrepância, segundo especialistas, expõe a falta de políticas públicas para que pessoas com renda mais baixa consigam adquirir um imóvel ou, então, pagar aluguel.
Ao todo, a cidade contabiliza 4.983.471 imóveis particulares de acordo com o Censo, 12% deles desocupados. O prefeito de São Paulo, Ricardo Nunes (MDB), estima que o déficit habitacional, hoje, é de quase 400 mil imóveis.
Procurada nesta segunda (3), a gestão Nunes não comentou os números apresentados pela reportagem e não especificou quais suas ações para o déficit habitacional e de acolhimento à população de rua até a publicação deste texto.
"A nossa falha como sociedade é não conseguir aproveitar esses imóveis, principalmente para política habitacional que contempla as pessoas de rendas baixa e baixíssima", afirma o arquiteto e urbanista Anderson Kazuo Nakano, professor do Instituto das Cidades da Unifesp.
Pelos dados do IBGE em 2010, a cidade reunia 290.317 unidades habitacionais sem qualquer morador. O número atual representa crescimento de 103%.
"O Censo também mostrou o deslocamento de parte da população para o interior", afirma a arquiteta Angélica Benatti Alvim, diretora da FAU Mackenzie.
"A prefeitura deveria fazer um mapeamento desses imóveis ociosos e aplicar o IPTU progressivo. Mas temos uma ausência de políticas de incentivo à ocupação desses imóveis principalmente a partir de locações sociais", completa Benatti Alvim.
O IPTU progressivo é um mecanismo utilizado pelas prefeituras para onerar os donos de imóveis vazios e inibir a especulação imobiliária em áreas com infraestrutura consolidada. O imposto prevê percentuais de reajuste a cada ano acumulado de ociosidade.
Segundo os especialistas, há vários fatores que justificam o volume de domicílios desabitados, mas o principal é a especulação imobiliária.
Também listam a degradação de algumas regiões, como o centro de São Paulo, e a migração de famílias com alto poder aquisitivo para apartamentos ou até mesmo cidades litorâneas e do interior. Nesse último caso, a tendência é que essas famílias preservem suas residências fechadas.
"É a retenção especulativa. Muitos prédios sendo adquiridos como investimentos e que acabam não sendo comercializados ou alugados. Outros motivos também como o envelhecimento do imóvel, disputa jurídica, massa falida", explica o professor.
Em paralelo ao abandono desses domicílios, São Paulo viveu nos últimos anos o crescimento da população em situação de rua. Dados do último levantamento municipal dessa fatia da população, encomendado pela gestão Nunes, apontam 31.884 sem-teto na capital -o número de imóveis vazios, portanto, supera em 18 vezes essa população.
O número dobrou se comparado com o levantamento de 2015, que registrou 15.905 pessoas vivendo nas ruas.
A mais recente contagem municipal, feita entre outubro e dezembro de 2021, ainda indica uma mudança do perfil daqueles que não têm um lar. O número de famílias que foram viver nas ruas quase dobrou durante a pandemia.
"São Paulo é uma cidade capitalista, onde o acesso à moradia é muito difícil. Quem não consegue pagar o aluguel vai para rua ou morar de favor com outras famílias em moradias precárias. Fatores que vão agravando o déficit habitacional", diz Nakano.
Outro ponto que chama a atenção no censo municipal da população de rua é que aumentou a quantidade de pessoas que preferem ocupar as ruas em vez dos abrigos. Em 2019, 52% da população abordada pelos pesquisadores preferia as calçadas aos centros de acolhimento, em 2021, esse percentual subiu para 60%.
"O pós-pandemia [de Covid] agravou muito [o déficit habitacional]. Em relação à inclusão social, não irá resolver somente com a locação social, mas com a promoção de albergues e de saúde pública", afirma Benatti Alvim.
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