SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Comerciantes da Santa Ifigênia, no centro de São Paulo, relatam rotina de tensão e desesperança desde que a cracolândia se estabeleceu no bairro. Mesmo com o policiamento reforçado, episódios de violência continuam se repetindo na região ?na noite de quarta-feira (1º), dependentes químicos invadiram e saquearam uma assistência técnica de celulares, deixando prejuízo de R$ 80 mil para os donos.

"Essa situação é absurda, eu mesmo logo vou cair fora daqui, porque o lugar não me dá segurança, e os clientes têm medo de vir. É um sufoco", desabafa o comerciante Walter Vaz de Lima, 58, dono de uma loja de equipamentos de áudio na rua dos Andradas há mais de 20 anos.

Atualmente, o fluxo ocupa de forma alternada dois endereços da região. Durante o dia, os usuários se concentram na rua dos Protestantes, e à noite se locomovem para rua dos Gusmões. Para evitar os deslocamentos, lojistas passaram a trabalhar em horário reduzido.

"Estou abrindo mais tarde e fechando mais cedo, porque tenho medo de fazerem alguma coisa. Seis meses atrás essa era uma rua boa, mas desse jeito está difícil manter o negócio. Hoje mesmo atendi só dois clientes", disse Wilson Malagoli, 74, enquanto observava uma abordagem a dois usuários de drogas em frente à sua loja, na rua dos Gusmões.

Nesta sexta-feira (3), as ruas do bairro tinham forte presença da PM (Polícia Militar) e da GCM (Guarda Civil Metropolitana). Ainda assim, a ação de criminosos não era inibida completamente. "Acabaram de roubar o celular de um rapaz aqui do lado", relatou Antônio Francisco da Costa, 71, que tem uma loja de circuitos eletrônicos na rua Vitória, a cerca de 200 metros de onde se concentravam centenas de dependentes químicos. "Hoje em dia vejo mais usuário andando na rua do que cliente."

De acordo com a união dos lojistas do bairro, o faturamento do comércio caiu em média 40% no último ano. Muitos comerciantes tiveram que fechar as portas, enquanto outros se mantêm de pé graças aos clientes antigos. Para tentar melhorar a sensação de segurança, lojistas passaram a contratar serviços de segurança particular.

"Eu não quero pensar que a região não é segura, eu nasci aqui e quero continuar aqui", diz Pâmela Cheda, 40, que trabalha na loja da família, na rua dos Andradas. Ela diz que geralmente os casos de violência acontecem depois de ações da GCM.

Segundo sistema de monitoramento do governo municipal, a cracolândia é mais movimentada durante a noite. Em outubro, as cenas abertas de uso de drogas foram frequentadas, em média, por 628 pessoas diariamente no período vespertino. Os dados também indicam aumento na média de frequentadores em comparação com o mês anterior.

Esse horário, segundo moradores e comerciantes, é justamente o mais perigoso para quem circula na região, já que o policiamento é reduzido.

Há menos de uma semana, após suposta tentativa de assalto, um motorista acelerou contra a aglomeração e atropelou 16 pessoas no cruzamento da avenida Rio Branco com a rua dos Gusmões, onde estavam concentrados os dependentes químicos. À polícia, o homem disse que foi cercado por usuários, que teriam quebrado o vidro do carro e roubado um celular e uma bolsa.

Depois do acontecimento, a Prefeitura de São Paulo começou a cercar o fluxo com grades durante a noite. Segundo a gestão Ricardo Nunes (MDB), a medida será adotada por tempo indeterminado para "proteger as pessoas em situação de vulnerabilidade e também os motoristas que transitam pela região".

Procurada, a SSP disse que a recuperação da área central de São Paulo é uma das prioridades da atual gestão, e que o policiamento foi reforçado com 120 PMs e outras 1.500 vagas pela Atividade Delegada (policiais militares que atuam no horário de folga por meio de convênio com a prefeitura). Quanto ao saque ocorrido nesta semana, a secretaria disse que "diligências estão sendo realizadas para identificar os participantes do crime".

A gestão Tarcísio de Freitas (Republicanos) acrescentou que monitora as cenas abertas de uso de entorpecentes e que "somente na última semana de análise (23 a 29 de outubro) foram 61 infratores presos em flagrante, além de 27 procurados da Justiça capturados. O monitoramento também apontou quedas de 52% nos roubos e 36% nos furtos na comparação com a primeira semana de análise, iniciada em 3 de abril", diz nota.


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