SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Um relatório que analisou 26 boletins de ocorrência e 15 laudos necroscópicos das mortes da Operação Escudo, que teve início após o assassinato de um policial militar no litoral de São Paulo, em julho deste ano, aponta falhas nas etapas iniciais das investigações de órgãos coordenados pela SSP (Secretaria da Segurança Pública). A operação deixou 28 mortos pela PM na Baixada Santista.

Procurada pela reportagem para comentar o relatório, a SSP não respondeu até a publicação deste texto.

O estudo, feito pela ONG Human Rights Watch (HRW), identifica problemas como falta de perícia nos locais das mortes, depoimentos prestados em grupo por PMs que participaram das ações com morte, boletins incompletos e relatórios de autópsia considerados ineficazes. Além da análise de documentos, o relatório foi elaborado a partir de 19 entrevistas com autoridades e familiares das vítimas.

A HRW também afirma que apenas 9 das 28 mortes tiveram imagens de câmeras corporais da PM enviadas ao Ministério Público. Esses dados ainda não tinham sido divulgados pelo MP-SP (Ministério Público de São Paulo), que havia feito um balanço apenas das 16 mortes iniciais.

Do total de 26 BOs (boletins de ocorrência) que registraram as mortes da operação, a perícia do local da morte foi solicitada em apenas 16. Em três casos a polícia decidiu não solicitar perícia com a justificativa de que não havia segurança suficiente no local e que a chuva impedia o trabalho. Um BO ficou incompleto e não foi possível determinar se a perícia foi solicitada, disse a ONG.

Em ao menos sete casos os corpos chegaram sem roupas ao IML (Instituto Médico Legal). "Itens de vestuário são particularmente relevantes para estimar a distância dos tiros e outras circunstâncias da morte", registra a HRW.

Ao analisar o que foi escrito nos BOs, a equipe da ONG notou que há casos em que a Polícia Civil pareceu ter a intenção de antecipar o resultado da investigação, "com base apenas nos depoimentos dos policiais envolvidos nos alegados confrontos, de que a Polícia Militar havia 'agido claramente em legítima defesa'".

A ONG diz que em alguns casos a Polícia Civil não pediu exames residuográficos, que ajudam a determinar quais envolvidos dispararam armas de fogo, tanto policiais como suspeitos. "Esses testes são particularmente úteis quando as autoridades alegam que as vítimas atiraram, como a Polícia Militar afirmou em 20 dos 26 boletins de ocorrência", diz o relatório.

O documento também afirma que peritos forenses internacionais analisaram as 15 autópsias às quais a HRW teve acesso. "Estes peritos concluíram que, 'com base nos relatórios preliminares da autópsia, os exames post mortem dos 15 indivíduos são ineficazes e não cumprem os padrões mínimos aceitáveis na investigação de mortes relacionadas com armas de fogo no contexto da ação policial'", diz a ONG.

"O Ministério Público deveria liderar investigações totalmente independentes sobre mortes cometidas por ação policial, contando inclusive com peritos independentes da polícia para realizar sua própria análise dos fatos e evidências", diz a ONG, no relatório. "O Ministério Público também deveria determinar se a Polícia Civil tem conduzido investigações minuciosas, imparciais e imediatas em todos os casos, incluindo nas investigações sobre as mortes de policiais."

A ONG ressalta que pediu informações sobre os procedimentos ao governo paulista, mas diz que o secretário Guilherme Derrite e o delegado-geral da Polícia Civil, Artur Dian, não responderam à equipe de pesquisa.

Em outras ocasiões em que se manifestou sobre a Operação Escudo, a SSP já afirmou que as investigações das mortes são feitas com rigor e que qualquer excesso, se identificado, será punido. Derrite já afirmou que nenhum laudo apontou sinais de tortura, ao contrário do que foi denunciado por moradores e familiares, e classificou parte da cobertura da imprensa como "canalha".

"Os laudos oficiais de todas as mortes, elaborados pelo Instituto Médico Legal (IML), foram executados com rigor técnico, isenção e nos termos da lei", disse a SSP, no fim de agosto. "A pasta reforça que as denúncias podem ser formalizadas em qualquer unidade da Polícia Militar, inclusive pela Corregedoria da Instituição. Desvios de conduta não são tolerados e são rigorosamente apurados mediante procedimento próprio."


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