SALVADOR, BA (FOLHAPRESS) - Quando um território quilombola é certificado pela Fundação Cultural Palmares, a região passa a ser reconhecida enquanto quilombo remanescente. Ou seja, uma comunidade descendente de população negra escravizada vinculada às raízes culturais daqueles grupos.

De acordo com a instituição, o país tem hoje 2.961 certidões emitidas, beneficiando 3.638 comunidades.

Mas a certificação pela Fundação Palmares não garante à comunidade a posse do território. Ela é a primeira fase de um processo pelo reconhecimento e propriedade da área.

A certidão é o passo que protege áreas quilombolas de riscos como tentativas de invasão, uso indevido da área, desmatamento, despejo para construções de empreendimentos, entre outras interferências. Isso porque, após certificado, o território não pode ser comercializado sem uma decisão judicial.

Em 2023, no primeiro ano do governo Lula (PT), foram emitidas 60 certidões, englobando 75 comunidades. Durante o governo de Jair Bolsonaro (PL), foram emitidas uma média de 106 certidões por ano ? 427 entre 2018 e 2022.

O estado com maior número de comunidades quilombolas certificadas é a Bahia, com 693 certidões emitidas, beneficiando, 854 comunidades.

Conforme dados do Censo 2022 do IBGE, o estado tem 397.059 autodeclarados quilombolas, e é também a unidade federativa com o maior número de pessoas desse grupo no país.

Para emitir a certificação, a fundação não faz um trabalho de conferência de quem é ou não quilombola.

Nesta etapa, respeita-se o direito à autodefinição determinado pela Convenção nº 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), documento em que se define quem são os povos indígenas e tribais e a obrigação dos governos em reconhecer e proteger os valores e práticas sociais, culturais religiosos e espirituais próprias desses povos.

A comunidade de Boipeba, na Bahia, foi uma das últimas a ser reconhecida como remanescente de quilombos pela Fundação Palmares. O ato ocorreu em dia 20 de setembro deste ano. A região engloba quatro comunidades quilombolas, Boipeba, Moreré, Monte Alegre e Cova da Onça.

A ilha de Boipeba tem atraído o setor de turismo, com planos de construir resorts de luxo na região. Isso gerou uma disputa judicial entre moradores e construtoras.

"É justamente através dessa certificação que pode ficar garantida a esperança de que a gente pode resistir e ficar naquele lugar. Por que o que está posto para acontecer naquelas duas ilhas é simplesmente a expulsão dos povos tradicionais para serem ocupadas por outras pessoas", diz o líder da Cova da Onça, Raimundo Esmeraldino, 60.

A comunidade estava no processo da certificação há um ano. "Esse reconhecimento é um passo gigantesco que a comunidade tá dando para mostrar para a sociedade que nós somos nativos, descendentes dos escravos e que a gente tem uma história de luta de preservação daquela ilha e que a gente precisa garantir esse território", diz ele.

Segundo a Fundação Cultural Palmares, fatores como documentação incompleta e quadro reduzido de servidores na instituição para realização das visitas técnicas são fatores que justificam a demora em processos de emissões das certificações.

Após a certificação, para conseguir o documento de propriedade no território, as comunidades precisam iniciar um processo no Incra ou nos institutos de terra estaduais.

ETAPAS PARA CERTIFICAÇÃO PELA FUNDAÇÃO PALMARES

A fundação certifica apenas aquelas comunidades já se autorreconheceram como quilombolas.

Três documentos são exigidos:

Ata de reunião específica para tratar do tema de autodeclaração, se a comunidade não possuir associação constituída, ou ata de assembleia, se a associação já estiver formalizada, seguida da assinatura da maioria de seus membros;

Breve Relato Histórico da comunidade (em geral, esses documentos apresentam entre 2 e 5 páginas), contando como ela foi formada, quais são seus principais troncos familiares, suas manifestações culturais tradicionais, atividades produtivas, festejos, religiosidade, etc.;

Requerimento de certificação endereçado à presidência da fundação

Outros documentos podem ser agregados, a critério da comunidade solicitantes, como fotos, registros de nascimento e óbito, títulos de propriedade ou posse, pesquisas e reportagens.

O projeto Quilombos do Brasil é uma parceria com a Fundação Ford


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