BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) - A Polícia Federal traça no seu relatório sobre o assassinato de Marielle Franco e Anderson Gomes a trajetória da família Brazão no Rio de Janeiro e aponta como seus integrantes mantiveram influência no governo estadual desde o governo de Sérgio Cabral até o atual, de Cláudio Castro (PL).

O conselheiro do Tribunal de Contas do Rio de Janeiro, Domingos Brazão, e seu irmão, o deputado federal Chiquinho Brazão, são apontados pela PF como mandantes do assassinato de Marielle Franco e Anderson Gomes. A defesa de Domingos afirma que não há ligação dele com o caso. Já a de Chiquinho diz que a prisão foi feita de forma "arbitrária" e baseada em presunções e declarações de criminosos que buscam reduzir a pena.

A ingerência política deles no poder público do Rio resultou entre os fatos, diz a PF, na nomeação do delegado Rivaldo Barbosa para chefiar a Polícia Civil. O delegado é colocado pelos investigadores como arquiteto do crime ao lado dos irmãos Brazão.

Ele foi nomeado chefe da Polícia Civil em 2018, durante a intervenção militar, mas já ocupava cargos de chefia na corporação a partir do governo de Sérgio Cabral, na primeira década dos anos 2000.

À época, afirma a PF, a influência de Domingos Brazão "alcançava patamares estratosféricos" uma vez que ele era uma das lideranças do PMDB, atual MDB, partido de Cabral e Luiz Fernando Pezão, os dois ex-governadores no período de ascensão da carreira de Rivaldo Barbosa.

O delegado foi comandou a Divisão de Homicídios desde 2015 até virar chefe da Polícia Civil em 2018.

O relatório de quase 500 páginas da PF traça a carreira política dos Brazão, em especial o conselheiro do TCE-RJ, e lista uma série de escândalos e suspeitas de irregularidades em órgãos públicos sob sua influência ao longo de seus mandatos como deputado estadual (1999 até 2015).

No relatório, a PF elenca o histórico de nomeações e suspeitas relacionadas aos Brazão em órgãos que vão do Inea, órgão estadual encarregado de atos de polícia administrativa ambiental, Comando do 18º Batalhão de Polícia Militar em Jacarepaguá, Instituto Estadual de Dermatologia Sanitária, Loteria do Estado do Rio de Janeiro e Fundação para a Infância e Adolescência.

"O líder do Clã Brazão, Domingos Brazão, esteve ao longo dos anos envolto em uma névoa criminal nunca dissipada em razão das relações político-estatais por ele construídas", afirma a PF sobre sua atuações nesses órgãos.

Assim como as principais lideranças do MDB no Rio, Domingos Brazão foi preso pela Lava Jato quando já ocupava o cargo no Tribunal de Contas. Foi solto e retornou ao TCE-RJ após decisão do STF (Supremo Tribunal Federal).

Mas, de acordo com a PF, ainda manteve sua influência na política e ingerência em indicações a cargos públicos.

Além de citar as indicações no atual governo, comandado por Cláudio Castro, a PF cita a própria nomeação de Rivaldo Barbosa, sob a intervenção federal, como tendo indícios de ser fruto de ingerência.

O General Richard Nunes foi ouvido pela PF e negou qualquer ingerência política na nomeação, mesmo após o setor de inteligência da secretaria de Segurança opinar contra a indicação.

A PF, no entanto, afirma que "o fato é que a passiva gestão dos militares à frente da Segurança Pública do Rio de Janeiro; sua falta de traquejo para manejar as vicissitudes do jogo de poder fluminense; sua vinculação a um Presidente da República do PMDB, bem como a manutenção da nomeação de Rivaldo mesmo após a contraindicação da Subsecretaria de Inteligência, são fatores indiciários do contrário."

Nunes disse à Folha de S.Paulo que pode ter sido ludibriado, "como toda a sociedade foi".

Já no governo de Cláudio Castro, a PF cita duas nomeações e o interesse em uma fundação para apontar a influência de Domingos Brazão.

A primeira delas foi a nomeação de William Pena --apontado como ex-segurança de Domingos-- para presidente do Departamento de Transportes Rodoviário do Estado do Rio de Janeiro e depois, mesmo após a operação da PF com base na delação de Élcio Queiroz apontar a influência de Brazão, para o cargo de Subsecretário de Planejamento e Integração Operacional na Polícia Civil.

A PF também utiliza uma foto de Domingos com o secretário de Governo, Bernardo Rossi, para reforçar a influência de Brazão no governo de Cláudio Castro.

"O Secretário de Governo é uma espécie de braço-direito do Governador. Nesse cenário, é latente que a ingerência da Família Brazão se manifesta até os dias atuais junto ao enredo político fluminense, o que se potencializa pelo exercício do cargo de Conselheiro do Tribunal de Contas do Estado por Domingos", diz a PF.

Por fim, o relatório cita a Fundação Leão XVIII, órgão ligado ao governo do Rio, alvo de apuração da PF em um inquérito que tem Cláudio Castro como investigado.

Segundo a PF, Brazão também atuaria no órgão e teria influência na estrutura.

"Outro fato que aproxima Brazão do governador Cláudio é o aparelhamento da Fundação Leão XIII, vista em tópico específico, cuja suspeita de desvio de recursos de seus contratos é objeto de Inquérito Policial de Relatoria do e. Ministro Raul Araújo, perante o c. Superior Tribunal de Justiça".

O secretário Bernardo Rossi diz ser "mentirosa qualquer ilação que o associe à família Brazão."

Por meio de nota, Rossi afirmou que a foto citada pela PF é de 2015 durante fiscalização de uma obra realizada pela Secretaria de Habitação, chefiada por ele à época.

"O então deputado Domingos Brazão era apenas um entre os vários convidados da agenda política", diz o texto.

O ex-governador Sérgio Cabral foi procurado nesta segunda (25) e não se manifestou até a publicação deste texto. A reportagem não localizou representantes da gestão Luiz Fernando Pezão.

Já a assessoria do governo Claudio Castro foi procurada nesta segunda (25) e terça (26), mas também não se manifestou.

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