O Núcleo de Acompanhamento de Reparações por Desastres (Nucard) do Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) emitiu, na última sexta-feira (7), uma Informação Técnico-Jurídica que determina a incorporação da dimensão climática na reparação integral dos danos causados pelo rompimento da Barragem I da Mina Córrego do Feijão, em Brumadinho, ocorrido em 25 de janeiro de 2019, um dos maiores desastres socioambientais da história do país.
O documento analisa a obrigação da Vale S.A. de inventariar, mitigar e compensar integralmente todas as emissões de gases de efeito estufa (GEE) geradas pelo desastre e pelas ações de reparação, seguindo princípios de reparação integral, poluidor-pagador e solidariedade intergeracional.
Neutralidade de carbono e três níveis de ação
Segundo o texto, as medidas de reparação devem ser executadas de forma carbono neutra, com atuação em três níveis:
- Prevenção e redução das emissões na fonte, com tecnologias mais limpas;
- Mitigação das emissões inevitáveis, com substituição de processos e combustíveis;
- Compensação integral das emissões residuais, com investimentos comprovados em remoção de GEE.
Essas determinações derivam de cláusulas já previstas no Acordo Judicial de Reparação Integral (AJRI), firmado em 2020 e vigente no monitoramento da reparação.
Proibição de apropriação de créditos de carbono
A Informação orienta que a Vale não pode se apropriar de eventuais créditos de carbono gerados pelas ações de reparação, sob risco de configurar enriquecimento ilícito e violar o princípio do poluidor-pagador.
Qualquer crédito gerado deverá ter destinação pública, priorizando:
- Benefícios às comunidades atingidas.
- Reforço à proteção climática.
- Investimentos adicionais de reparação.
O documento cita como precedente o Novo Acordo de Mariana, homologado pelo Supremo Tribunal Federal em novembro de 2024, que já estabelece diretrizes semelhantes.
Monitoramento, transparência e auditoria
A Vale deverá apresentar um inventário completo das emissões geradas direta e indiretamente pelas obras de reparação, incluindo escopos 1, 2 e 3, com publicação periódica de relatórios e auditoria independente.
O inventário deverá detalhar:
- Fontes emissoras.
- Métodos de cálculo.
- Estimativa de emissões futuras.
- Eficácia das medidas de mitigação.
Papel do Sisema
O Sistema Estadual de Meio Ambiente (Sisema) é apontado como agente central no controle das obrigações, podendo:
- Exigir inventários e metas de neutralização.
- Determinar medidas compensatórias adicionais.
- Validar tecnicamente planos da Vale.
- Integrar monitoramento climático ao licenciamento ambiental.
Caso deixe de exigir quantificação, mitigação e compensação das emissões, o órgão poderá incorrer em violação ao dever constitucional de proteção ambiental.
Diretrizes normativas
A Informação cita dispositivos que embasam as exigências, entre eles:
- Constituição Federal, art. 225 (proteção ambiental e gerações futuras).
- Lei 6.938/1981 (Política Nacional do Meio Ambiente).
- Política Nacional sobre Mudança do Clima (Lei 12.187/2009).
- Resoluções do Conselho Nacional de Justiça.
- Legislações estaduais sobre inventário de emissões.
Alinhamento internacional
A orientação ocorre às vésperas da COP 30, que será sediada em Belém a partir desta segunda-feira (10) e vai até o dia 21 de novembro, ampliando a relevância da agenda climática no país.
Recomendações finais
Entre as medidas consideradas essenciais pelo Ministério Público estão:
- Retomada imediata do programa de estimativas de emissões.
- Metas progressivas para atingir o carbono zero.
- Condicionantes climáticas em novas licenças.
- Realização de audiências públicas específicas sobre clima.
Segundo o documento, tais medidas visam evitar a criação de novos passivos ambientais durante o processo de reparação e garantir que os danos climáticos também sejam adequadamente compensados.