SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - O serviço de mototáxi em São Paulo não tem nenhum obstáculo que o impeça de ser oferecido a partir do dia 11, quando termina o prazo dado pela Justiça à gestão Ricardo Nunes (MDB) para regulamentar a atividade, dizem especialistas ouvidos pela Folha, embora este não seja um argumento unânime.
O tema é alvo de uma queda de braço entre o governo do emedebista e aplicativos de transporte, que desde 2023 buscam reverter um decreto editado naquele ano pela Prefeitura de São Paulo que suspendeu o serviço de táxi por motocicletas.
A norma acabou contestada no Poder Judiciário e acabou derrubada pelo TJ-SP (Tribunal de Justiça de São Paulo) em setembro deste ano.
O TJ concordou com os argumentos da CNS (Confederação Nacional de Serviços), autora da ação, segundo os quais o decreto da gestão Nunes viola os princípios da livre iniciativa e da livre concorrência.
A decisão que declarou inconstitucional o texto do emedebista deu 90 dias para que a administração municipal promovesse a regulamentação do setor ?prazo que termina na próxima quinta (11).
Depois disso, dizem especialistas consultados pela reportagem, serviços poderão ser oferecidos.
"A prefeitura teria 90 dias para regulamentar o serviço de transporte individual, considerando sua competência constitucional, que não compreende a suspensão da atividade", diz Ana Scalioni, especializada em direito administrativo.
Para ela, "há um claro interesse da população na disponibilidade de meios de transporte alternativos e acessíveis, sobretudo em momentos de crise no transporte público".
Uma das apostas da administração Nunes envolve projeto que a Câmara prevê aprovar que cria regras ao serviço de mototáxi e condiciona o exercício da atividade a um credenciamento prévio da Prefeitura ?processo que pode durar até 60 dias.
É uma cláusula passível de questionamentos, diz Scalioni, "caso gere alguma impossibilidade no exercício da atividade".
"O ideal, pela Constituição e pela Lei da Liberdade Econômica, é que prefeituras tenham por princípio a liberação das atividades econômicas não ilegais em geral e criem obstáculos apenas àquelas de alto risco. Não é o caso, dadas as decisões judiciais sobre o tema", diz João Gabriel Lemos Ferreira, mestre em direito constitucional pela ITE (Instituição Toledo de Ensino).
Já a advogada Vera Chemim, mestre em administração pública pela FGV (Fundação Getulio Vargas), afirma que "não há o que se fazer".
"Se o TJ deu um prazo que vence no dia 11, o município deveria ter agilizado a aprovação dessa lei. Então penso que, independentemente da existência de lei municipal, esse serviço poderá ser retomado com base em decisão do Supremo", afirma Vera.
Ela se refere a julgamento da corte que invalidou norma aprovada pela Alesp (Assembleia Legislativa de São Paulo) que condicionava o exercício de mototáxi no estado à aprovação de leis municipais que o permitissem.
Para o STF, o estado não tem competência para legislar sobre o assunto e, mais do que isso, a condição imposta no texto legal criava barreiras ao exercício da atividade profissional.
Chemim diz que o credenciamento é "essencial e indispensável do ponto de vista prático, até por questão de segurança", mas que caberá à administração correr para realizá-lo. Até lá, afirma, prevalecerá norma federal que permite o exercício da atividade.
Há divergências, contudo, e "há a necessidade de prazo para se dar a regulamentação de uma atividade extremamente arriscada e de consequências danosas", afirma o advogado Carlos Figueiredo Mourão, mestre em direito constitucional pela PUC-SP (Pontifícia Universidade Católica de São Paulo).
"Cabe apontar a questão de saúde decorrente dos acidentes de motocicleta na cidade de São Paulo, que afeta o município e impacta a sociedade, devendo ser analisada a liberdade de abrir novas atividades empresárias", acrescenta.
Linha semelhante adota o prefeito Ricardo Nunes, que rechaça qualquer possibilidade de retomada dos serviços de mototáxi no dia 11 "seja por decisão judicial, seja pela regulamentação que vai existir". Para o mandatário, empresas de aplicativo adotam postura irresponsável ao anunciar o serviço já para a próxima quinta.
"Que a gente tenha o mínimo de cuidado e cautela na preservação da vida das pessoas."
Nunes cita também estudo do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada) segundo o qual "a tendência recente de aumento da mortalidade por usuários de motocicleta é particularmente preocupante e demanda atenção urgente das autoridades e da sociedade".
É um argumento que não faz sentido na avaliação do professor da USP Floriano de Azevedo Marques Neto, advogado da Amobitec (Associação Brasileira de Mobilidade e Tecnologia), que reúne prestadoras de serviços de aplicativo.
"[O serviço de mototáxi] não é mais perigoso do que o transporte individual de motocicleta ou a atividade de entregador do iFood, por exemplo", diz.
Marques Neto, que é também ministro do TSE (Tribunal Superior Eleitoral), diz que as próprias plataformas têm mecanismos para garantir que motoristas evitem abusos -como avaliações, botões de pânico e outros.
"Do contrário, afinal, ele será descadastrado", diz o advogado, para o qual "quem começar o serviço no dia 11 de dezembro não está cometendo nenhuma ilegalidade".