CURITIBA, PR (FOLHAPRESS) - Uma atividade organizada pela Sesp (Secretaria de Estado da Segurança Pública) do governo do Paraná na semana passada incluiu uma exposição de fuzis e outros armamentos para crianças de uma escola cívico-militar de Colombo, na região metropolitana de Curitiba.
Um vídeo em que é possível ver parte da exposição repercutiu nas redes sociais e recebeu críticas da APP-Sindicato, entidade que representa os professores da rede pública estadual. Para a presidente, Walkiria Mazeto, os estudantes estão sendo expostos à cultura da violência.
Ela diz ter levado as imagens ao Ministério Público, à Defensoria Pública e à Controladoria Geral do Estado.
"As imagens do vídeo mostram crianças aglomeradas em frente a uma mesa, montada no ginásio da escola, onde estão dispostos pelo menos cinco fuzis, uma pistola e outras armas utilizadas pelo batalhão de Rondas Ostensivas de Natureza Especial, unidade de elite da Polícia Militar do Paraná", relata a entidade.
"O vídeo também mostra que as crianças usam o celular para tirar fotos do armamento, enquanto são observadas por um policial militar, sem a presença de profissionais da educação", continua a APP-Sindicato.
Questionada pela Folha de S.Paulo nesta terça-feira (9), a Seed (Secretaria de Estado da Educação) orientou que a reportagem procurasse a Sesp.
Por meio de nota, a Sesp afirmou que a atividade era uma ação institucional e que equipes do Proerd (Programa Educacional de Resistência às Drogas e à Violência), da Patrulha Escolar, da Patrulha Maria da Penha, do Corpo de Bombeiros e de unidades especializadas "apresentaram aos alunos aspectos do trabalho diário das forças de segurança".
"Este é um tipo de ação tradicional que acontece em escolas, praças, feiras e eventos comunitários. Os equipamentos exibidos estavam em área supervisionada, sem qualquer tipo de manuseio pelos estudantes", afirma a nota.
Acrescentou que o secretário da Segurança Pública, coronel Hudson Leôncio Teixeira, conversou com os alunos "sobre dedicação aos estudos e valorização da escola pública, reforçando o papel da educação e da segurança na formação cidadã".
"A Sesp destaca que todas as atividades têm foco em prevenção, informação e aproximação responsável com a comunidade", continua a nota.
A secretaria também disse à reportagem que atividades semelhantes acontecem em todas as escolas, não apenas nas unidades cívico-militares.
A APP-Sindicato associa o caso ao modelo de escola cívico-militar implantado na gestão Ratinho Junior (PSD) e relembra outro vídeo que veio à tona recentemente nas redes sociais, no qual alunos de um colégio em Curitiba aparecem marchando em uma quadra esportiva enquanto entoam uma canção que faz apologia à violência.
Segundo a Seed, a gravação é do final de 2023 e "na época foram adotadas medidas pedagógicas para evitar novos casos".
Em um dos trechos, a letra diz que a missão do Bope, o Batalhão de Operações Policiais Especiais, ligado à Polícia Militar, é "entrar na favela e deixar corpo no chão". Depois, a canção diz que o Bope "mata, esfola, usando sempre o seu fuzil".
A Seed afirmou que a iniciativa de entoar a letra partiu de uma estudante e que ela teria sido interrompida pelo monitor, quando ele percebeu o teor da canção.
Nas imagens, é possível ver que os alunos estão sob supervisão de um adulto, que seria um militar aposentado na função de monitor da escola, como prevê o modelo cívico-militar.
Após a repercussão do episódio de Curitiba, a deputada estadual Ana Júlia (PT) protocolou em 1º de dezembro dois requerimentos, ao Ministério Público e à Defensoria Pública, solicitando "a apuração imediata dos fatos, a identificação dos responsáveis e a adoção de medidas de proteção às crianças e adolescentes envolvidos".
"O que vemos nesse modelo é um projeto que substitui pedagogia por autoritarismo, por meio de militares aposentados sem formação pedagógica. Isso é incompatível com qualquer concepção moderna e democrática de educação", afirmou a deputada.
A rede estadual de ensino público no Paraná tem mais de 300 unidades do tipo cívico-militar, um modelo criado por lei estadual em 2020 e inspirado em um programa adotado no governo federal anterior, de Jair Bolsonaro (PL).
Na escola cívico-militar, há uma disciplina de cidadania e civismo, e a rotina dos alunos é acompanhada por integrantes do Corpo de Militares Estaduais Inativos do Paraná, que atuam como monitores.
A lei tem sido alvo de contestações, incluindo uma ação direta de inconstitucionalidade no STF (Supremo Tribunal Federal) proposta pelos partidos PT, PSOL e PCdoB.