SÃO PAULO, SP (UOL/FOLHAPRESS) - A repercussão do caso do menino Benício Xavier, 6, que morreu depois de receber adrenalina na veia em um hospital particular de Manaus (AM), levantou questionamentos se a médica responsável pela prescrição do medicamento pode seguir exercendo a profissão mesmo sob investigação criminal.

Juliana Brasil Santos passou a ser investigada pela Polícia Civil após a morte de Benício. Na última semana, depois de ter admitido que errou na prescrição da adrenalina, a médica mudou sua versão sobre os fatos e atribuiu o erro ao sistema usado pelo hospital. Recentemente, a profissional teve sua prisão negada pela Justiça, segundo o delegado do caso. Em entrevista à CNN, Marcelo Martins afirmou que o Tribunal de Justiça do Amazonas concedeu habeas corpus a Juliana no último dia 8, após sua defesa apresentar como prova um vídeo que mostraria o sistema hospitalar trocando automaticamente a via de administração do medicamento. Procurado pelo UOL para confirmar a decisão, o TJ-AM ainda não retornou.

Médicos podem seguir exercendo profissão ainda que sob investigação criminal. Isso porque, segundo Washington Fonseca, advogado especialista em Direito Médico e mestre em Direito pela PUC-SP, não é atribuição ou competência de delegados e promotores de Justiça impedir que um profissional de saúde deixe de exercer sua profissão enquanto a investigação ainda estiver em curso.

Profissionais processados criminalmente podem, porém, ser impedidos de atuar como médicos por decisão judicial liminar. "Mas deve existir uma evidência muito contundente para que isso ocorra", ressalta Fonseca. "Até porque, se não houver o contraditório e a ampla defesa sendo instituídos em favor do médico, uma decisão dessa natureza pode prejudicar, por toda uma vida, uma pessoa que venha a ser declarada inocente lá na frente", acrescenta.

"Para que um médico deixe de exercer sua profissão, é necessário que se requeira uma ordem judicial. Seja no juízo Civil ou Criminal, a ordem deve partir de um juiz", disse o advogado Washington Fonseca, especialista em Direito Médico.

CONSELHOS REGIONAIS DE MEDICINA TAMBÉM PODEM SUSPENDER OU CASSAR EXERCÍCIO MÉDICO

Além da Justiça, Conselho Regional de Medicina pode determinar a suspensão das atividades de um médico, diz advogado. O CRM, como órgão fiscalizatório da atuação médica, pode suspender liminarmente, por meio de uma investigação interna, o exercício da profissão por um médico, segundo Fonseca.

A autarquia também pode cassar o exercício de um médico sob investigação administrativa. Após a abertura de um processo ético-profissional pelo CRM, pelo qual também deve ser garantida a ampla defesa do profissional, a suspensão da atividade médica pode ser convertida em cassação definitiva, ou então em reversão da decisão liminar, ainda de acordo com o advogado.

"Não é só a Justiça Criminal ou Civil que tem esse condão, mas o próprio conselho [pode aplicar a suspensão e cassação da atuação médica] contra um profissional que o órgão entenda que tenha tido uma má conduta no exercício da profissão ou até mesmo fora", disse o advogado Washington Fonseca, especialista em Direito Médico.

Nem sempre uma ação na Justiça comum é encaminhada aos conselhos. Segundo o CFM (Conselho Federal de Medicina), os processos éticos profissionais têm esfera administrativa independente da esfera judicial. Por isso, ainda é possível encontrar casos de médicos condenados judicialmente no exercício da profissão, conforme mostrou apuração do UOL.

Médicos podem receber cinco tipos de sanções no exercício de suas atividades. Conforme a lei nº 3.268/1957, são elas: a) advertência confidencial em aviso reservado; b) censura confidencial em aviso reservado; c) censura pública em publicação oficial; d) suspensão do exercício profissional até 30 dias; e) cassação do exercício profissional, ad referendum [que deve ser referendada] do Conselho Federal.

Questionado sobre eventual pena disciplinar à médica Juliana Brasil, o CRM de Manaus não retornou. O texto será atualizado em caso de eventuais manifestações do conselho.