ORLANDO, EUA (FOLHAPRESS) - Uma estudo realizado por pesquisadores do Einstein Hospital Israelita e financiada pelo Ministério da Saúde mostrou resultados promissores para pacientes com leucemia B e linfomas utilizando a terapia CAR-T.

Considerada uma das técnicas mais promissoras para tratamento de cânceres de sangue (hematológicos), a pesquisa com o CAR-T é a primeira aprovada pela Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) e realizada inteiramente no Brasil.

O método consiste em retirar o sangue do paciente, modificar as células de defesa (linfócitos T) para que identifiquem e destruam o câncer, multiplicá-las em laboratório e depois reintroduzi-las no organismo, permitindo que o próprio corpo combata o tumor. O processo é totalmente personalizado e realizado uma única vez.

"É a primeira vez que a indústria farmacêutica faz uma coisa diferente. Ela não pega um remédio da prateleira e dá ao paciente. Ela retira as células do paciente no hospital, encaminha e trata essas células em uma fábrica para que elas se voltem contra o tumor", diz Nelson Hamerschlak, coordenador do Departamento de Hematologia do Einstein e um dos autores do estudo.

Os dados de fase 1 do estudo intitulado Carthiae mostram que, dos 11 pacientes tratados, 81% tiveram alguma resposta, sendo que 72% tiveram resposta completa, mesmo após vários tratamentos anteriores.

Um ano depois da realização do procedimento, 71% dos pacientes estão vivos e sem progressão da doença. Os resultados foram apresentados durante o encontro anual da ASH (Sociedade Americana de Hematologia), que aconteceu em Orlando, Flórida, nos Estados Unidos, entre os dias 6 e 9 de dezembro.

O Ministério da Saúde investiu R$ 31,9 milhões no estudo. O recurso prevê a execução, monitoramento e acompanhamento dos ensaios, "com o objetivo de ampliar a capacidade científica, tecnológica e produtiva do país com o desenvolvimento de terapias alogênicas".

Em nota, a pasta afirmou que investe R$ 542 milhões para estruturar uma rede nacional de terapia celular, incluindo CAR-T, para expandir a capacidade produtiva e a infraestrutura no país.

Segundo o ministério, para que a tecnologia seja incorporada amplamente no SUS (Sistema Únido de Saúde), é necessário conseguir o registro na Anvisa e aprovação pela Conitec (Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no SUS), que analisa evidências sobre eficácia, segurança e custo-efetividade.

Além do estudo do Einstein, outros quatro projetos de CAR-T avançam no Brasil: USP (Universidade de São Paulo) Ribeirão Preto, Instituto Butantan, Fiocruz/Inca (Fundação Oswaldo Cruz/Instituto Nacional do Câncer) e UFC (Universidade Federal do Ceará). Todos, porém, ainda estão em estágios prévios, em negociação ou aguardando aprovação da Anvisa.

A pesquisa Carthiae, do Einstein, fez a triagem de 18 pacientes, mas sete foram excluídos por não apresentarem doença ativa. Entre os 11 restantes, 72,7% eram homens, com idade média de 42 anos, provenientes das regiões Norte, Nordeste e Sudeste do Brasil. Cada pessoa havia passado por uma média de quatro tratamentos prévios sem sucesso. O estudo prevê incluir mais 30 pacientes até o meio do próximo ano.

A técnica utilizada pelo Einstein é a de fabricação point-of-care, quando as células do paciente são coletadas, multiplicadas e reintroduzidas no corpo na mesma instituição, reduzindo custos.

Segundo Hamerschlak, o tratamento comercial padrão com CAR-T custa entre US$ 300 mil e US$ 400 mil, com despesas adicionais de hospitalização variando de US$ 100 mil a US$ 200 mil, totalizando de US$ 400 mil a US$ 600 mil (de R$ 2 milhões a R$ 3 milhões).

Isso porque o processo exige o envio das células do paciente para centros nos EUA ou Europa, com etapas de armazenamento complexas.

"Como a célula é colhida, processada e devolvida ao paciente na própria instituição aqui no Brasil, o nosso custo varia entre 10% a 20% do custo padrão", afirma.

Ou seja, o processo pode ficar de 80% a 90% mais barato, variando entre R$ 200 mil a R$ 600 mil. Isso ajuda a reduzir custos e dependência de tecnologia importada, um dos principais obstáculos para o uso mais amplo desse tipo de tratamento no Brasil e em países de média renda.

"É muito importante que tenha essa linha de baixo custo. No fim, tanto o paciente do sistema público quanto do privado podem se beneficiar, diz Hamerschlak

Além disso, realizar todo o processo no Brasil é mais rápido. Na pesquisa, a etapa de multiplicação das células em laboratório levou 12 dias, com tempo máximo "veia a veia", ou seja, da coleta a reinfusão, de 22 dias. A taxa de sucesso dessa multiplicação foi de 100%, um indicador incomum mesmo em centros internacionais.

Segundo o coordenador do estudo, no tratamento padrão, que depende do envio para outro país, esse período pode chegar a 40 dias. "Se o paciente está progredindo, isso é um problema."

*O repórter viajou a convite da Johnson & Johnson.