BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) - O presidente da Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária), Leandro Safatle, 48, afirma que o órgão regulador deve atuar para promover pesquisas e medicamentos desenvolvidos no Brasil.

"A indústria na área de saúde [nacional] cresceu muito, graças aos genéricos e agora aos biossimilares. Ela ganhou musculatura, está com condições de investir em inovação", disse Safatle em entrevista à Folha.

A agência definiu uma lista de produtos que deseja tirar do papel ou ampliar o uso, incluindo a polilaminina, droga desenvolvida em pesquisa liderada por Tatiana Coelho de Sampaio, professora da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro), e que, segundo estudos iniciais, se mostrou capaz de reverter sequelas de lesão medular.

"São assuntos que vão subir para a alta gestão para ajudar nesse processo. Se existir algum problema [na análise], vamos montar um comitê de especialistas, contratar algum ator importante, sentar com as áreas técnicas", afirmou.

O chamado comitê de inovação da Anvisa ainda irá avaliar processos envolvendo o método Wolbachia, a bactéria que impede o mosquito Aedes aegypti de desenvolver e transmitir os vírus da dengue, zika e chikungunya, além da endoprótese vascular, que é um dispositivo inserido em veias ou artérias em tratamentos menos invasivos.

Safatle afirma que o plano é trabalhar com até cinco projetos e que a vacina contra a chikungunya do Butantan deve ser incorporada ao comitê em breve.

Economista e servidor público federal, Safatle tomou posse em setembro no comando da Anvisa. Antes, atuou na cúpula do Ministério da Saúde, da Fiocruz e chefiou a CMED (Câmara de Regulação do Mercado de Medicamentos), pasta que define preços dos medicamentos e é ligada à Anvisa.

Ele aponta como prioridade da sua gestão a redução das filas da agência. Em novembro, os diretores aprovaram uma série de medidas para a Anvisa conseguir cumprir os prazos legais de análise até o fim de 2026. Para medicamentos que não recebem algum tipo de priorização, por exemplo, o período de avaliação seria de até um ano.

A Anvisa estima que, nos piores casos, leva até três anos para liberar o registro. Safatle afirma que a redução dos prazos dá previsibilidade para quem investe no Brasil. "A empresa não sabe quando vai lançar o produto dela. Um genérico, se levar dois ou três anos para poder sair, o mercado já se acomodou."

A mobilização inclui a chegada de 250 novos servidores, investimento de R$ 25 milhões em inteligência artificial e mudanças na ordem de análise dos produtos.

Protagonista na pandemia da Covid-19, quando se tornou alvo do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) por aprovar o registro de vacinas, a Anvisa regula mais de 20% do PIB (Produto Interno Bruto) por meio de temas como medicamentos, vacinas, dispositivos médicos, agrotóxicos, alimentos e cigarros. Ainda fiscaliza aeroportos, portos e fronteiras.

O impacto na economia e sobre a rotina da população mobiliza congressistas, governo e a indústria pela indicação dos cinco diretores da agência. Em 2026, a Anvisa ainda deve apresentar uma resolução sobre o cultivo de Cannabis no Brasil com fins de pesquisa e produção de medicamentos. O STJ (Superior Tribunal de Justiça) determinou que a medida deve ser aprovada até março.

A chegada do novo presidente, junto de outros dois diretores, consolidou uma mudança de perfil do órgão regulador, antes composto por nomes indicados por Jair Bolsonaro e presidido, até o fim de 2024, pelo contra-almirante Antônio Barra Torres.

Integrantes da indústria avaliam que o órgão vinha se alinhando ao Ministério da Saúde mesmo antes da nomeação de Safatle. A nova postura tem provocado divergências. Um dos focos de tensão com parte das associações das farmacêuticas foi a decisão de passar à frente da fila de análise as canetas emagrecedoras contendo liraglutida e semaglutida, os mesmos ingredientes ativos de marcas como Saxenda e Ozempic.

A medida foi tomada dias antes da chegada de Safatle, sob o argumento da agência de que existe risco de desabastecimento das canetas e após pedido da gestão Alexandre Padilha (PT), que defendeu "reduzir a dependência tecnológica" e promover "soberania e autonomia nacional".

Parte do setor de medicamentos critica a quebra da ordem das análises e diz que a medida atrasa a avaliação de dezenas de outras terapias que aguardam o aval para comercialização, enquanto associações ligadas à indústria nacional elogiam a medida.

Safatle nega prejuízo às terapias estrangeiras com as decisões recentes da Anvisa.

"A gente gosta tanto da inovação local quanto estrangeira acontecendo. Se você tem uma terapia que está dando assistência para a população, é muito importante. Como é que você não vai priorizar algo assim? Tem que priorizar", disse.