MARIANA, MG (FOLHAPRESS) - Os sinos da Catedral Basílica Nossa Senhora da Assunção, em Mariana (MG), anunciaram a grande alegria: após quase dez anos em silêncio para restauro, o histórico órgão Arp Schnitger voltou a ecoar na manhã do último dia 8. E concertos especiais festejaram a volta às atividades do órgão.
Datado do século 18, o instrumento na igreja de Minas Gerais é o único do tipo localizado fora da Europa, dos cerca de 30 ainda existentes do famoso organeiro alemão Arp Schnitger, segundo o padre Geraldo Dias Buziani, reitor da catedral.
A cerimônia seguiu um rito próprio da Igreja Católica, com antífonas e orações que evocam o reavivar do instrumento. A cada invocação, o órgão respondia, preenchendo o templo com sua melodia por meio das mãos da organista Josinéia Godinho.
"A gente sente que o órgão voltou para aquela situação para a qual ele foi feito. Ele só veio para Mariana por causa da criação da diocese. Se não tivesse a diocese, não teria o órgão aqui. Então, quando ele volta a tocar dentro da liturgia, é um momento em que ele retoma a história dele", conta a organista.
Construído entre 1700 e 1710 na Alemanha, o órgão é um instrumento de sopro em que cada um dos seus tubos funciona como se fosse uma flauta. Instalado na Catedral de Mariana em 1753, foi um presente do rei dom João 6º à recém-criada Diocese de Mariana.
"Ele está muito íntegro, ainda com todos os seus elementos originais, mesmo com as pequenas intervenções e restauros que já houve no caminho [...]. Para Minas Gerais e para o Brasil, é uma das peças mais importantes musicais que a gente tem", afirma a arquiteta Deise Calvacanti Lustosa, coordenadora-técnica do projeto de restauração do órgão.
O instrumento histórico volta às suas atividades litúrgicas e culturais após quase uma década de silêncio, devido às obras de restauração da catedral, iniciadas em 2016, quando a estrutura sonora do instrumento foi desmontada.
Em setembro de 2022, durante o processo de remontagem em preparação à reabertura do templo religioso, constatou-se uma infestação de cupins nos dois someiros do instrumento, peças que desempenham papel fundamental no funcionamento, ao armazenar e distribuir o ar para os tubos.
Segundo Lustosa, o ataque foi a consequência de uma intervenção realizada anteriormente, em 1980, durante a primeira restauração do órgão, quando foi inserida indevidamente uma placa de compensado ao instrumento ?removida na restauração deste ano.
"O trabalho feito com os someiros foi importante porque, como ele funciona como uma caixa de ar, não poderia ter espaços vazios, e os cupins tinham criado várias galerias", explica.
Para serem restaurados, os someiros foram enviados, em março deste ano, à Espanha, onde permaneceram por três meses para serem restaurados na oficina de Frédéric Desmottes. O organeiro francês foi também o responsável pela desmontagem do instrumento em 2016 e acompanha todas as etapas desde aquele ano.
Além da restauração, foram efetuados também os trabalhos de limpeza e higienização das peças, o tratamento da caixa do órgão externa, a restauração dos dois anjos sedestres, bem como o trabalho de montagem total e afinação do instrumento.
"Durante a montagem, a gente também aproveitou para fazer uma revisão total dos mecanismos do órgão e a limpeza de algumas partes que eram bem complicadas no seu acesso", diz Desmottes.
Antes disso, entre 2000 e 2002, o órgão passou por uma segunda restauração que o deixou ainda mais próximo ao seu estado original.
280 ANOS DA ARQUIDIOCESE DE MARIANA
A reinauguração do instrumento ocorre em um momento simbólico e festivo para a Arquidiocese de Mariana: a comemoração dos seus 280 anos.
Criada em 6 de dezembro de 1745, ela foi a primeira diocese do Brasil fora do litoral e a igreja primacial de Minas Gerais. Ainda, a data celebra os 40 anos de ordenação sacerdotal do seu arcebispo, dom Airton José dos Santos.
Para o padre Buziani, a celebração é uma ocasião de júbilo e marca a conclusão dos trabalhos de restauração do templo histórico. Com a reinauguração, o órgão voltará a exercer suas funções litúrgicas em algumas celebrações dominicais às 10h e nas festas e solenidades religiosas.