Artigo
As rela?es conjugais e suas nuances

::: 19/08/2004

A filosofia popular versa de v?rias formas sobre as rela?es conjugais, construindo ditados e tecendo os mais diversos coment?rios a respeito desse assunto. Tais ditados e coment?rios, habitualmente, demonstram conota??o paradoxa entre os aspectos bons e ruins do casamento.

Dessa maneira, percebe-se a oscila??o entre o desejo e o temor, permeando essa op??o de vida a dois. Alguns desses ditados expressam esses sentimentos de forma c?mica, tal como: ?casamento ? como caipirinha de boteco, todo mundo sabe que d? dor de cabe?a, mas mesmo assim quer experimentar?.
Al?m disso, ? comum ouvir opini?es sobre a pr?pria rela??o conjugal, quando conflituosa, como: ?em briga de marido e mulher ningu?m mete a colher.?

Nesse sentido, observando tal contexto, que faz parte das escolhas do parceiro amoroso ou mesmo conflitos conjugais, percebe-se que esse assunto n?o desperta somente a an?lise das lentes populares, mas tamb?m de alguns tipos de profissionais.
Esses profissionais englobariam psic?logos de v?rias especialidades, como psic?logos cl?nicos ou jur?dicos, bem como psiquiatras ou demais profissionais que precisem lidar com as quest?es que envolvam as rela?es conjugais.

Sendo assim, algumas dessas pessoas, na tentativa de estudar a rela??o de casal com intuito, n?o somente de entender seus processos, mas de propor novas maneiras de vivenci?-la de forma saud?vel, tra?aram novos paradigmas de entendimento da rela??o a dois.

Uma dessas pessoas, o psiquiatra, psicodramatista e autor Victor Dias, tra?ou considera?es que ajudam na compreens?o do casamento a partir dos v?nculos que se formam nessa rela??o. Assim, Dias argumenta que o v?nculo conjugal pode abranger toda e qualquer rela??o existente no casamento.
Esse autor complementa que o v?nculo conjugal abrange o casamento como um todo e ? afetado por qualquer crise que se instale.

Nessa dire??o, Victor Dias defende que o casamento ? sustentado por um tipo espec?fico de v?nculo e amparado por alguns outros. Tais v?nculos s?o definidos por Dias como: v?nculo amoroso, compensat?rio e de conveni?ncia.

Quando um casal ? sustentado pelo v?nculo amoroso, por exemplo, os v?nculos compensat?rio e de conveni?ncia o amparam.
Desta forma, um desequil?brio no v?nculo principal pode afetar com bastante ?nfase o casamento, ao passo que um desequil?brio nos v?nculos auxiliar n?o representa grande amea?a ? sa?de da rela??o.

Assim, quanto aos tipos de v?nculo, pode-se esclarecer, a partir dos ensinamentos de Victor Dias que o v?nculo amoroso caracteriza-se pela atra??o erotizada entre o homem e a mulher.
Esse v?nculo ?? respons?vel pela sensa??o de encantamento que se instala entre o casal, e ? o que sustenta a rela??o de amor.

O v?nculo amoroso se instala a partir de um foco de atra??o que vai desencadear uma paix?o ou uma sensa??o de encantamento. Tanto a paix?o como o encantamento podem ser entendidos como sentimentos, nos quais existe uma intensa atra??o pela pessoa amada e uma sensa??o de que esta pessoa possa preencher todas as lacunas afetivas da outra. "? uma sensa??o de ter encontrado uma alma g?mea" (Dias, 2000). O parceiro amoroso ? visto como uma pessoa perfeita.

A conviv?ncia tende a diminuir a sensa??o de encantamento e paix?o inerentes ao v?nculo amoroso, deixando transparecer as caracter?sticas do parceiro amoroso, que talvez n?o sejam muito agrad?veis, exterminando a perfei??o da rela??o inicial.
Quando isso acontece ? necess?rio que o casal estabele?a um di?logo honesto, revelando suas decep?es e assumindo as caracter?sticas desagrad?veis de forma que seja criada uma rela??o de confian?a, restabelecendo o v?nculo de amor, ent?o de forma reeditada e mais madura.

O segundo tipo de v?nculo conjugal definido por Dias ? o v?nculo compensat?rio. Este ? um v?nculo de depend?ncia que forma o casal. A depend?ncia ocorre porque um dos parceiros delega ao outro, independentemente da concord?ncia deste ou n?o, fun?es psicol?gicas que deveriam ser de sua responsabilidade.

As fun?es delegadas s?o de tr?s tipos e est?o ligadas a tr?s fun?es psicol?gicas: cuidar, julgar e orientar. Quando um parceiro delega ao outro a fun??o de cuidar, ?o indiv?duo considera que a responsabilidade de cuidar de seus pr?prios interesses, tanto afetivos quanto materiais, passa a ser daquele outro.
Caso a fun??o de cuidado n?o seja executada satisfatoriamente pode ocorrer uma certa tens?o na rela??o do casal.

No que diz respeito ? fun??o de julgar,?o indiv?duo considera que a responsabilidade de julgar, de considerar como certas ou erradas, boas ou m?s, adequadas ou inadequadas suas pr?prias atitudes passa a ser daquele (Dias, 2000).?
Do mesmo modo que na fun??o de cuidado, a fun??o de julgamento quando n?o desempenhada gera frustra??o e tens?o no casamento.

Por fim, na ?ltima fun??o, a pessoa delega ao seu companheiro o papel de orient?-lo, dirigir sua vida e decidir as atitudes que deve ou n?o tomar. A fun??o de orienta??o pode incluir decis?es como, a que restaurante ir e que comida comer, at? decis?es profissionais ou relacionadas ? economia dom?stica.

A execu??o das fun?es delegada geradas a partir do v?nculo compensat?rio pode ir se desgastando no decorrer da conviv?ncia do casal. ?Os parceiros v?o se cansando de complementar a fun??o delegada (Dias, 2000)?. Tal fato tende a gerar frustra??o, ocasionando uma crise conjugal.

Uma rela??o sustentada pelo v?nculo amoroso tende a ser mais saud?vel do que aquela sustentada pelo v?nculo compensat?rio. Apesar disso, a rela??o de um casal que se forme baseada em um v?nculo compensat?rio n?o est? fadada ao fracasso. Os parceiros descobrem formas de manter o v?nculo amoroso, mesmo n?o sendo esse a raz?o principal de sua constitui??o.

Finalmente, o ?ltimo tipo de v?nculo ao qual Victor Dias se refere ? o v?nculo de conveni?ncia. Esse tipo de v?nculo ? baseado em rela?es de interesse, tais como interesses ?financeiros, econ?micos, sociais, comerciais, pol?ticos, profissionais, familiares?, dentre v?rios outros apontados por Dias.

Esse autor divide os v?nculos de conveni?ncia em tr?s grupos. No primeiro desses grupos a conveni?ncia pode ser expl?cita e ser a pr?pria causa do casamento. Nesse caso, ?o casamento ? fruto de um acordo de interesses que beneficia os parceiros ou suas fam?lias, suas cren?as, seus pa?ses, suas comunidades (Dias, 2000).?
Assim, na maioria das vezes a conveni?ncia ? expl?cita e os parceiros almejam um objetivo em comum.

No segundo grupo que comp?e a forma??o do v?nculo de conveni?ncia estabelecido por Dias, a conveni?ncia ? encoberta e pode ser ou n?o a causa do casamento.
Dessa maneira, Victor Dias explica que nesse grupo, em geral, a conveni?ncia n?o ? claramente explicitada pelos parceiros, mas ? poss?vel ter uma id?ia de sua exist?ncia

Al?m disso, pode estar clara para um dos parceiros e n?o para o outro, ou ? um acordo impl?cito entre os dois. Esse ? o caso, por exemplo, do casal que se forma para que a mo?a, ou mesmo o rapaz, saia da casa dos pais por n?o estar satisfeito com a conviv?ncia familiar original.
Dias alerta que nesses casos ? comum ocorrer uma crise conjugal ap?s a conquista do objetivo que gerou a rela??o de conveni?ncia.

O terceiro grupo ? identificado nas rela?es de conveni?ncia que se estruturam durante a vida conjugal. Nesse caso, o casal tem uma s?rie de interesses em comum resultantes da vida a dois que s?o dif?ceis de separar.
Os interesses em comum podem ser representados pelos filhos, patrim?nio econ?mico, as rela?es sociais, entre outros como explica Dias.

Todas essas explica?es sobre as rela?es conjugais favorecem o entendimento da forma??o de casais. O conhecimento dessas rela?es revela-se importante para a identifica??o do v?nculo que est? sendo formado, possibilitando o estabelecimento de rela?es mais saud?veis, honestas e maduras.

Refer?ncia bibliogr?fica:
DIAS, Victor R. C. S. V?nculo conjugal na an?lise psicodram?tica.
Diagn?stico estrutural dos casamentos. ?gora, S?o Paulo: 2000


Denise Mendon?a de Melo
? psic?loga, formada pelo
a Centro de Ensino Superior
de Juiz de Fora.
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