Trabalhadores das ruas enfrentam dificuldades no dia a dia Expostos ao sol e à chuva, os trabalhadores podem desenvolver problemas de saúde provocados por fatores variados

Aline Furtado
Repórter
15/3/2010

Não é preciso andar muitos metros pelas vias centrais de Juiz de Fora para encontrar um trabalhador que ganha a vida nas ruas. Embora não existam dados referentes a todos estes trabalhadores, pois muitos atuam de modo informal, o número de ambulantes licenciados cadastrados chega a 430 em Juiz de Fora, sem contar bancas de jornais, vans e comércio em veículos automotores

O supervisor de licenciamento da Secretaria de Atividades Urbanas (SAU), Floriano Pinto Moura, diz que a fiscalização pretende atuar de forma a reduzir o número de ambulantes, visto que o número de cadastrados não reflete a realidade das ruas. "Percebemos que alguns estão em débito com relação à taxa paga anualmente à Prefeitura de Juiz de Fora e não vêm usando o espaço." O valor pago por ano é de R$ 134,58 para ocupação de ruas da região central da cidade.

Diante do grande número de trabalhadores atuando nas ruas de Juiz de Fora, o que muito não imaginam são as dificuldades encontradas por estas pessoas no dia a dia. Há 34 anos trabalhando como camelô em uma rua da região central, Maria Angélica Batista Souza destaca o gasto mensal com estacionamento, onde guarda a barraca e com o aluguel do local em que a mercadoria fica acondicionada. "Pago, por mês, R$ 85 de estacionamento e mais R$ 60 de aluguel de um quartinho onde guardo as caixas." Segundo a comerciante, entre outros problemas enfrentados estão as dificuldades acarretadas pelo tempo. "Bom seria se tivesse uma barraca fixa. Assim, não gastaríamos dinheiro além da taxa paga à Prefeitura, e não seria necessário correr tanto quando chove."

Banca de frutasEla lembra ainda que a fiscalização proíbe a colocação de plásticos sobre as barracas. "Não podemos usar cadeira, mas não tem como ficar em pé o dia inteiro." Moura confirma que entre as proibições referentes aos ambulantes é a utilização de material para cobrir a mercadoria e o uso de cadeiras. Ele afirma ainda que os trabalhadores devem respeitar a demarcação prevista, assim como o tamanho limite para as bancas, que é diferente para aquelas que se destinam a materiais perecíveis e a não perecíveis. "O ambulante tem direito a um substituto por no máximo duas horas diárias. Neste período, é possível, entre outras coisas, se alimentar", explica o supervisor.

Com relação ao uso do banheiro, Maria Angélica relata que depende da boa vontade de porteiros de um edifício vizinho, além de, ocasionalmente, utilizar banheiros de um shopping center. "Lá é preciso pagar R$ 1. Acho que poderia haver um convênio entre a Prefeitura e o shopping, assim não precisaríamos pagar pelo uso dos sanitários."

Vendedor de picoléPara a ambulante Maria José Montinotti, que comercializa frutas há quase vinte anos em uma das ruas centrais da cidade, os grandes problemas são causados pela chuva e pelo sol. "Quando está muito quente, corro o risco de perder a mercadoria, já quando chove, é preciso colocar um plástico sobre a barraca." Além disso, outro problema enfrentado por ela é o acondicionamento da mercadoria enquanto não está trabalhando. "Por estar neste ponto há muito tempo, guardo as frutas na banca de revista ou em uma lotérica aqui perto. Já a barraca, levo e busco todos os dias em um estacionamento perto da Praça da Estação." O uso de banheiro só não é problema para a comerciante porque ela fez amizade com os porteiros de um prédio e eles permitem que ela utilize os sanitários.

Para o vendedor de picolé Geraldo Carlos da Fonseca, que trabalha há três anos nas ruas de Juiz de Fora, a dificuldade de usar banheiros é grande. "Tenho o costume de usar o banheiro público do Parque Halfeld, mas quando estou muito longe de lá, acabo contando com a boa vontade do pessoal dos bares e lanchonetes." O mesmo é relatado por um policial militar, que não quis se identificar. "Quando estamos próximo a alguma base da Polícia Militar, dá para usar o banheiro, mas quando não, pedimos em lojas, restaurantes e em outros estabelecimentos."

EngraxateO engraxate Paulo Figueiredo Campos, que atua há dois anos e meio nas ruas, também aponta a não disponibilização de banheiros públicos como um dos principais problemas. "Hoje em dia não tenho problema quanto a isso porque já conquistei a confiança dos porteiros de um prédio vizinho e utilizo o banheiro de lá. Mas em casos mais complicados, como uma dor de barriga, por exemplo, acabo usando o sanitário de um shopping." Ele relata que o gasto com a água consumida ao longo do dia acaba sendo um peso no orçamento mensal.

A cidade conta, hoje, com 20 pontos destinados aos engraxates. Desde a implantação do projeto Novo Passo, em 2001, a intenção é manter a harmonia na região central, por meio da padronização das caixas usadas pelos trabalhadores e dos uniformes. Segundo a coordenadora executiva do Departamento de Inclusão Produtiva da Associação Municipal de Apoio Comunitário (AMAC), Josélia Avelino, dos 20 postos, 16 estão sendo usados, dois estão em manutenção e dois estão em fase de processo de análise de cadastrados.

Banheiros
A cidade conta, atualmente, com apenas dois espaços que oferecem banheiros públicos na região central, um no Parque Halfeld e um no Espaço Mascarenhas. No Parque Halfeld, dois banheiros, um masculino e um feminino, são administrados pelo Departamento Municipal de Limpeza Urbana (Demlurb). Segundo o diretor de operações, José Fabiano de Resende, embora os usuários devam pagar R$ 0,50 para o uso, o movimento é grande no local. "Por se tratar de uma área de trânsito intenso de pessoas e de lazer, o fluxo é grande durante todo o dia. O local acaba funcionando como gargalo para estas pessoas que trabalham nas ruas e não têm outros locais para usar." Os banheiros funcionam das 7h às 19h, de segunda a sábado. 
Riscos à saúde

A rotina dos trabalhadores que atuam nas ruas pode acarretar sérios problemas de saúde. De acordo com a diretora administrativa do Departamento de Saúde do Trabalhador, Ivone Garcia, os riscos são os mesmos para os trabalhadores formais e informais. "Estes problemas podem ter causas naturais, já que estão expostos ao sol e à chuva, além de serem provocados pela exposição a ruídos constantes, a estresse e a acidentes."

Segundo a diretora, os ruídos de automóveis podem ocasionar déficit auditivo pela exposição constante e por se tratar de sons intermitentes, ou seja, que não têm intervalos. Além disso, o trabalho nas ruas pode ser fonte geradora de estresse, que, por sua vez, pode desencadear sofrimentos psíquicos, ansiedade e depressão. "Os trabalhadores irregulares sofrem pressão diária porque tentam driblar a fiscalização. Isso gera muito desgaste."

Outros riscos dizem respeito a acidentes, como atropelamentos e violência verbal e física, à infrequência ao banheiro, que pode acarretar problemas renais, além do risco causado pelo fato de o trabalhador ficar muito tempo em pé. "O perigo para quem fica em pé em uma mesma posição durante todo o dia é bem maior do que para quem fica em pé, mas anda ao longo de um dia. Podem surgir varizes e problemas nas articulações."

Os textos são revisados por Madalena Fernandes