Aline Maia Aline Maia 29/8/2012

Brigas de jovens: sentença de morte decretada pela própria sociedade

Até quando testemunharemos inertes os confrontos de adolescentes levados às últimas consequências? Mais de dez assassinatos já foram registrados em 2012 em JF

MãoEndereços distintos. E assim um grupo de jovens justifica o confronto com outros jovens. Por que o fato de morar em bairros diferentes é apontado como motivação decisiva para o enfrentamento entre adolescentes? Por que esta situação parece estar crescendo vertiginosamente em Juiz de Fora? As rotuladas "brigas de gangues" e suas consequências tornaram-se banais. E a população tem se acostumado a acompanhar, quase que diariamente nos meios de comunicação, os casos trágicos destes cidadãos que mal se lançaram à vida e já caminham para a morte. Pior: a população se acostuma, se conforma e não age. Por que? Por que perdemos a capacidade de indignação e ação frente ao extermínio de jovens promovido, aparentemente, por estes mesmos jovens? Lemos no noticiário que mais um infeliz de 15 ou 17 anos foi assassinado no meio da rua e.... Ok. Coitado. Passemos à próxima manchete. Por que?

Na busca por respostas, uma explicação pode ser encontrada no próprio tempo em que vivemos. A pós-modernidade, conforme o sociólogo polonês Zygmunt Bauman, é marcada pela volatilidade das coisas e das relações humanas. Tudo é descartável e nada é feito para durar ... (Nem a própria vida?) Soma-se a esta instabilidade o jogo consumista, imperativo na contemporaneidade, de forma que são taxadas como incapazes as pessoas que não têm meios econômicos para responder aos atrativos do mercado consumidor. As periferias e favelas configurariam os principais redutos destes indivíduos "fora de lugar" na sociedade do consumo. Estes homens e mulheres "estranhos" recorreriam aos únicos recursos que possuem em quantidade suficientemente grande para impressionar: buscando defender seu "território", inventariam atitudes bizarras, quebrariam normas e desafiariam a lei. Uma possível justificativa para as organizações de jovens cuja finalidade única é enfrentar seus iguais?

Paralelamente, enquanto adolescentes se matam, a sociedade empenharia-se em apagar a realidade que vê. Mais uma postura da pós-modernidade onde a habilidade em esquecer talvez seja até mais importante que a capacidade de memorizar - condição contínua de adaptação em um mundo em que novas coisas e pessoas entram e saem sem finalidade do campo de visão. E, assim, a morte escancarada nas ruas e nas mídias já não produz sentimento de revolta, piedade ou outro qualquer: torna-se demasiada habitual, excessivamente comum para ser dramática. Por que?

Já faz tempo que família, escola e Igreja dividiam sozinhas a responsabilidade na formação dos indivíduos. Segundo o jornalista e sociólogo brasileiro Muniz Sodré, sem representações seguras, o jovem torna-se mais facilmente permeável à regulação tecnocultural do mercado, que tem como um dos valores básicos a fama - mesmo que em determinados grupos este reconhecimento público implique a criminalidade, como vemos entre estes garotos que acabam por aparecer na mídia não em razão de seu cotidiano mas, sim, em função do quadro sinistro de vida que supostamente levariam organizados em "gangues". A este contexto acrescentaria-se, ainda, a droga, instituída como relação social.

Não é meu intuito justificar os constantes enfrentamentos entre jovens. Muito menos traçar uma sociologia da violência juvenil. O propósito, este sim, é questionar por que nos acomodamos frente a esta realidade cruel que tem se materializado a cada dia em nosso meio. Mais: questionar, inquietar e induzir à ação. É compromisso da sociedade, em todos os seus segmentos. Desde o início deste ano, as brigas entre grupos de jovens rivais resultaram em mais de dez mortes em Juiz de Fora. Famílias padecem sem muito o que fazer sozinhas. Não podemos tratar simplesmente como "caso de polícia" um problema que, para começar a ser resolvido, demanda, no mínimo, uma revisão na educação, na saúde e na geração de emprego e renda. A cidadania de cada um precisa estar assegurada e garantida pelos esforços conjuntos de todos. Do contrário, continuaremos a testemunhar, inertes, a elevação das estatísticas de morte entre jovens. E só. Passemos à próxima manchete.

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Aline Maia é jornalista e professora universitária. Graduada e Mestre em Comunicação pela UFJF, tem experiência em rádio, TV e internet. Interessa-se por pesquisas sobre televisão, telejornalismo, cidadania e juventude.Também é atuante em movimentos populares e religiosos

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