Professores analisam matrizes e habilidades do novo Enem A principal preocupação é relacionar as diversas áreas de conhecimento e interpretar conceitos conforme situações do cotidiano

Clecius Campos
Repórter
7/7/2009

O sistema de inscrições do novo Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) recebeu quase 2,6 milhões de inscrições até as 17h desta terça-feira, dia 7 de julho. Em Minas Gerais, mais de 270 mil alunos aderiram à nova prova. As informações são do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (Inep). As inscrições estão abertas até o próximo dia 17 de julho.

Para o coordenador das turmas de pré-vestibular de uma escola da cidade, Welson Ribeiro, a prova é uma realidade entre os alunos. "Eles estão preocupados em estudar de forma adequada, já que o programa será usado por 70% das universidades federais do país. Uma boa preparação deverá levar em conta a integração entre professores e áreas, já que essa é a proposta do novo exame."

Segundo Ribeiro, a inexistência de um determinado conteúdo e a abrangência das matrizes de referências e habilidades são os pontos mais complicados do modelo do teste. "Os alunos estão mais acostumados a questões conteudistas. Estabelecer relações entre as diversas áreas pode ser difícil." O imediatismo da implantação é outro problema a se enfrentar.

Para o supervisor das turmas de Ensino Médio de uma escola da cidade, Ronaldo Cardoso Campos, a expectativa é de que seja realizada uma prova mais interpretativa, mas que contemple também o conteúdo. "Porém, o ideal seria que o Inep divulgasse as questões-modelo prometidas desde o anúncio das mudanças." De acordo com a assessoria de comunicação do Inep, não há previsão de quando o simulado será publicado.

O Portal ACESSA.com ouviu professores de várias áreas a fim de saber qual é a expectativa a respeito da cobrança de cada conteúdo e passar dicas aos vestibulandos.

Matemática e suas Tecnologias

Foto de alunos fazendo provaPara o professor de matemática Guilherme Calderano, o conteúdo da disciplina deve ser cobrado com o mesmo rigor no novo Enem, mas abordado de forma diferente. A diferença é que, em vez de as questões matemáticas serem construídas pelos próprios conceitos, será cobrada a aplicação da matemática no cotidiano. "Acredito que a prova virá com uma leitura mais crítica da disciplina, porém as questões deverão envolver uma matemática de qualidade. Por isso, penso que será necessário que o aluno conheça conceitos elementares, regras principais e fórmulas."

Cálculos envolvendo porcentagem e juros, aliados a questões econômicas mundiais devem tornar o conteúdo mais interdisciplinar. Calderano crê que problemas com tratamento estatístico, leitura de gráficos, apuração de dados e interpretação devem ganhar espaço. "O aluno precisa preocupar-se em entender o que significa um cálculo de área, a resolução de um logaritmo e a disposição de uma linha no plano cartesiano."

A aplicabilidade da matemática também deve estar presente. "A geometria provavelmente será cobrada tomando como base sólidos existentes. O cálculo da pizza em partes iguais para um determinado número de pessoas pode cair na prova, por exemplo." A dica é preparar-se bem, ter paciência, concentração e ler as questões com cuidado.

Linguagens, Códigos e suas Tecnologias

Foto de mão escrevendoA professora de português Marília de Melo Costa afirma que a matriz de habilidades que contém o conteúdo da língua portuguesa não é muito diferente dos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) para o Ensino Médio. Para ela, o que muda é que, com a utilização do Enem para acesso às universidades federais, estes parâmetros passaram a ser seguidos de forma mais sistemática.

"É preciso trabalhar a contextualização do conteúdo em problemas reais, buscando o enfrentamento dessas questões e apontando soluções para elas. Em língua portuguesa, isso deverá ser cobrado levando-se em conta a compreensão e a produção do texto, aliados ao estudo das estruturas e funções dos elementos na frase." Segundo Marília, essa deve ser a forma como a morfologia e a sintaxe podem ser cobradas.

Embora o novo Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa não seja obrigatório, a professora acredita que é possível que ele seja explorado neste Enem. "Provavelmente as regras não serão cobradas, já que os alunos ainda têm três anos e meio para se adaptar, mas uma análise sobre o impacto das regras ou sobre a relação entre os países pode ser pedida."

Para estudar literatura, a dica de Marília é conhecer os estilos literários e saber reconhecer em trechos de obras a que período eles pertencem. "Decorar em quais estilos os autores escreveram não deve adiantar. Provavelmente será pedida uma justificativa estilística para a resposta do aluno."

A redação não deve mudar. Marília pensa que a interpretação do tema, a construção dos textos, a argumentação e a capacidade de elaborar propostas serão os conteúdos mais cobrados. "Mas é claro que não se deve utilizar palavras chulas nem ferir direitos humanos em redações. Além disso é preciso estar adequado à norma culta e ao nível formal de linguagem."

Ciências Humanas e suas Tecnologias

Foto de caneta sobre folha de papelNo campo das ciências humanas estão sendo cobrados conteúdos de história e geografia. Para o professor de geografia Carlos Augusto Pedro, a disciplina é a mais privilegiada com a apresentação das novas matrizes. "Conceitos ligados à sociedade, as relações sociais como um todo e a intervenção do homem na natureza são o foco da geografia. Ela já está ligada às outras disciplinas complementares, como história e biologia. Fazer essa comunicação não vai me dar dor de cabeça."

Ele explica que, ao estudar, o aluno deve trabalhar sua capacidade argumentativa e de análise, inclusive para a área de geografia física. "O melhor é trabalhar o conteúdo de forma crítica, relacionando os elementos da natureza com o cotidiano das pessoas. Como os prejuízos na vegetação podem influenciar o clima? O que pode ter ocasionado o Tsunami no sul da Ásia em 2005? Questões como essas devem ser cobradas." Além disso, a capacidade de leitura e interpretação de gráficos, mapas e tabelas também deve ser explorada.

Para a história, a mudança significa o fim da decoreba de datas e nomes. De acordo com o professor Welson Ribeiro, o importante é conhecer a história ao longo do tempo e pensar na disciplina como o processo de evolução da humanidade. "É legal entender conceitos que nasceram na Antiguidade e ainda são usados hoje e como eles são trabalhados em um período histórico determinado. Diferenciar a democracia na Grécia Antiga da democracia hoje é uma questão interessante."

Ribeiro acredita que a integração da história com a geografia não é tão problemática, por serem disciplinas auxiliares. Ele lembra que conceitos históricos podem ser usados também em questões de literatura.

Ciências da Natureza e suas Tecnologias

Foto de livro, lapiseira e borrachaA matriz Ciências da Natureza e suas Tecnologias englobam as disciplinas de biologia, química e física. Para o professor de biologia Ricardo Nunes, o modelo do novo Enem é positivo para o ensino da ciência. Ele acredita que o aspecto conteudista deixará de ser o foco principal da matéria, com a cobrança de habilidades e competências. "É necessário, porém, que sejam conhecidos os conceitos da biologia descritiva, de classificação e organização, além da nomenclatura. Pois, embora o Enem não vá abordá-los, é possível que a segunda fase do vestibular da UFJF os explore."

Ele afirma que para atender à necessidade de interação entre as disciplinas é preciso que tanto professores quanto alunos tenham conhecimento das demais disciplinas. "Fenômenos físicos e químicos são muito utilizados no estudo da biologia. O interessante é buscar uma linguagem que consiga abranger todos os conteúdos."

O professor de química Rafael Alves afirma que para ter sucesso nesta área é preciso que o aluno saiba identificar os conceitos da química. "É interessante fazer exercícios que relacionem a base teórica com as ciências naturais. O aluno que entender essa disciplina não tem porque temer o Enem." Ele adverte que certos elementos da matéria, como o estudo das cadeias de carbono na química orgânica, não podem deixar de ser decorados, por conta do vestibular da UFJF. "O aluno não vai poder optar por estudar para este ou aquele sistema de seleção. Por enquanto eles devem continuar distintos."

Para o professor de física Marcus Vinicius Vieira, a nova prova ajuda o aluno a traçar uma linha de construção do conhecimento da disciplina, sem precisar decorar fórmulas. "Embora a tendência do exame seja mais raciocínio, a preocupação com o conteúdo deve existir. Sem conhecer os conceitos da física e como ela funciona, a capacidade de argumentação fica prejudicada." Para ele, a interação com outras disciplinas deve aparecer em questões do cotidiano. "O cálculo do nível sonoro de um aparelho, por exemplo, vai necessitar do conhecimento básico de logaritimo."

Os textos são revisados por Madalena Fernandes